Quando passo fundo ficou pequena

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Quando passo fundo ficou pequena

Em 31/12/2008, por Mauro Gaglietti[1], Márcia Helena Saldanha Barbosa[2] e Carlos Alceu Machado[3]


Quando passo fundo ficou pequena: nos rastros de Tarso de Castro[4]

Neste texto, busca-se desvendar os múltiplos fios que ligam um indivíduo - muitas vezes esquecido - ao seu tempo. Reporta-se, no caso, a Tarso de Castro, pensando na articulação entre a trajetória individual do referido jornalista – analisada por Sônia Bertol (2001) e Tom Cardoso (2005) – e o contexto no qual esta se realizou como uma via de mão dupla, em que se estabelece uma interação ente ambos. Desse modo, examina-se a tensão, e não a oposição, entre o individual e o social. Tal procedimento ancora-se nas teses do historiador Michel de Certeau (1984, p.xi), segundo o qual cada ser humano deve ser entendido como “um locus no qual uma incoerente e freqüentemente contraditória pluralidade de determinações relacionadas interagem”[5].

Com base em tal afirmação, entende-se que, embora cada jornalista, cada escritor seja singular, algumas trajetórias têm pontos em comum. Tal é o caso, por exemplo, de George Orwell e Tarso de Castro[6]. Este último nasceu na década em que o primeiro trabalhava para o jornal britânico Observer. Essa atuação, situada entre 1942 e 1948, deu-se nos tempos da Segunda Guerra Mundial, e, sobretudo, dos conflitos relacionados ao surgimento do fascismo, do nazismo, do comunismo, do capitalismo, do liberalismo, do socialismo e do anti-semitismo, principais correntes ideológicas que marcaram o século XX. Trata-se de um terreno paradoxal, que é o do indivíduo e da coletividade, o da liberdade e da mecanização, de temas que se constituem, ao mesmo tempo, em objeto e em produto da linguagem introduzida por Orwell.

George Orwell escreveu seu primeiro artigo para o Observer em fevereiro de 1942. Sua relação com o periódico inglês, no entanto, começara quase um ano antes, ao conhecer David Astor, então proprietário e futuro editor do jornal. A empatia foi imediata – o editor admirava a “absoluta franqueza, honestidade e decência” de Orwell, e a íntima amizade entre os dois avalizou os artigos que o escritor redigiu para o periódico londrino ao longo da década de 1940.

David Astor desejava modernizar o veículo, que, em sua opinião, estava sufocado, política e editorialmente, nas mãos do jornalista demissionário J.L.Garvin. Com o intuito de fomentar a polêmica, David Astor introduziu uma coluna, por ele denominada de “Fórum”, e encarregou Orwell de inaugurá-la. Então, com um artigo pioneiro, intitulado “A vez da Índia”, Orwell defendeu radicalmente a independência desse país, marcando a longa oposição do Observer ao colonialismo britânico, o que custou milhares de leitores a David Astor, em especial em 1956, no período em que o jornal organizou a reação à campanha de Suez. Ironicamente, a primeira contribuição de George Orwell para o Observer apareceu logo abaixo da última publicação de J.L. Garvin, em 22 de fevereiro de 1942.

George Orwell escreveu no Observer sobre um conjunto bastante amplo de temas: Dickens, Birmânia, De Gaulle, Guerra Civil Espanhola, crianças desamparadas, Oscar Wilde, antisemitismo e Guarda Civil britânica, da qual fora um membro diligente. Como a maior parte de sua produção jornalística, esses artigos eram produzidos em alta velocidade.

Para se ter uma idéia do impacto político da obra de George Orwell, convém retomar o fragmento em que Winston Smith - personagem do livro 1984 e autor do texto intitulado “Liberdade é escravidão” -, pensa sobre a situação que vivencia quando está prestes a capitular com o Partido:

Capitulara; não havia dúvida. Na realidade, percebia agora que estivera pronto para capitular muito antes de tomar essa decisão. Desde o momento em que se encontrara no Ministério do Amor – e mesmo durante aqueles minutos em que ele e Júlia haviam esperado, inermes, as ordens da voz férrea da teletela – percebera a frivolidade, a inutilidade da sua tentativa de levantar-se contra o poder do Partido. Sabia agora que havia sete anos a Polícia do Pensamento o vigiava como quem examinava um besouro sob a lupa. Não havia ato físico, nenhuma palavra em voz alta, que não tivesse sido observado, nenhuma associação de idéias que não tivesse podido inferir. Não poderia mais lutar contra o Partido. Além disso, o Partido tinha razão. Devia ter: como poderia enganar-se o cérebro imortal coletivo? Por que padrão extra-sensório poderia medir seus raciocínios? A sanidade era estatística. Era apenas questão de aprender a pensar como o Partido. (1984, p.257) O escritor faz, assim, parte do rol seleto de autores que mescla política e literatura, sem, com isso, prejudicar a linguagem estética em detrimento da obediência a um pensamento político unilateralmente direcionado.

George Orwell, após ter trabalhado em Paris como operário, presencia as ações violentas do Império Britânico na Birbânia e luta na Guerra Civil Espanhola, ao lado de anarquistas socialistas, juntando-se, a partir de 1937, às fileiras do Partido Operário de Unificação Marxista. Em 1944, concluiria o célebre A revolução dos bichos, uma crítica mordaz não só aos rumos que o comunismo havia tomado, como também a todo tipo de regime centralizador, fielmente representado na conhecida expressão: “Todos os animais são iguais, mas alguns animais são mais iguais do que os outros”. Durante os três anos seguintes, escreveria o clássico 1984 – publicado em 1949, pouco antes de sua morte, aos 46 anos, provocada pela tuberculose -, um marco da alegoria moderna de supressão do indivíduo pela utopia coletiva, pelo controle centralizado da linguagem e, conseqüentemente, do poder.

As formas do exercício do poder discricionário no Brasil também adquiriram contornos bem definidos. Em 31 de março de 1964, por exemplo, o presidente João Goulart foi deposto pelas Forças Armadas. Na história recente do Brasil, o verbete “regime militar” é sintético e pouco esclarecedor, como se tocasse numa ferida não cicatrizada, que inspira cuidados. Inúmeros protagonistas dos chamados “anos de chumbo” estão vivos. Além disso, as versões para os fatos históricos estão impregnadas de fanmio, de Minas Gerais, e Panfleto, do Rio de Janeiro[7].

Conforme dados divulgados por extensa bibliografia, 366 brasileiros morreram ou desapareceram como resultado da ação das forças de segurança do Estado, enquanto durou o regime militar, de 1964 a 19854 Ressalta-se, também, que milhares de indivíduos tiveram seus direitos políticos e civis cassados. Todavia, a ditadura no Brasil foi menos feroz do que na Argentina, onde ocorreu uma verdadeira matança da população civil. Entidades de direitos humanos calculam que lá chegou a 30 mil o número de mortos e desaparecidos, muitos dos fantasmas que rondam porões, onde centenas de brasileiros foram submetidos à tortura e ou levados à morte. Desse modo, os historiadores tentam decifrar a longa noite que se abateu sobre as instituições democráticas por 21 anos, com suas contradições e enigmas.[8]

Os primeiros expurgos deram-se no calor do golpe - que teve expressivo apoio de diversos segmentos da sociedade brasileira -, ainda como parte dos impulsos vingativos e punitivos daqueles que o promoveram. Os barões da imprensa, que ajudaram a planejar o golpe visavam, sobretudo, à destruição de seu principal concorrente, ideológico e de mercado, a cadeia de jornais Última Hora, criada por Samuel Wainer. Este e muitos outros jornalistas ligados ao chamado “campo popular” exilaram-se ou foram presos. Houve “limpezas” em redações de jornais regionais em todo o país e nos periódicos alternativos Binôquais foram jogados de aviões (sem pára-quedas), mas não sem antes haver recebido a extrema-unção de um padre que estava a bordo da aeronave.

Assinala-se, ainda, que o regime militar brasileiro foi o primeiro na América Latina a abrir espaço para intervenções semelhantes no Uruguai (julho de 1973), no Chile (setembro de 1973) e na Argentina (março de 1976). Há indícios de colaboração entre os militares do Cone Sul. No Estádio Nacional do Chile, logo após o golpe de Augusto Pinochet, prisioneiros ouviram instrutores militares falando em português ao orientar interrogadores chilenos, como atesta em entrevista – concedida a um programa da TV-COM (RBS), em março de 2004 - o presidente do Movimento de Justiça e Direitos Humanos (MJDH) do Rio Grande do Sul, Jair Krischke. Em seu depoimento, o entrevistado destaca, também, que parte das técnicas de interrogatório usadas no Brasil eram de inspiração francesa, tendo sido provenientes da guerra da Argélia, e que, até a Segunda Guerra Mundial, a principal influência do Exército brasileiro era a escola militar da França.

Outra técnica utilizada foi a de origem inglesa, testada no combate ao grupo separatista irlandês IRA, a qual consistia em submeter o interrogado a temperaturas extremas de calor e frio ou a alternância de luminosidade máxima e penumbra. Isso ocorria ao mesmo tempo em que as paredes da sala do interrogatório se moviam em direção ao acusado. Cabe ainda lembrar uma invenção brasileira, o “pau-de-arara”, técnica exportada para a Argentina e para o Paraguai - que ganhou a denominação de “periquera” (referente a periquito), afirma Krische[9]-, a qual consistia em pendurar a pessoa de cabeça para baixo, e submetê-la a toda a sorte de sevícias e de agressões.

Destaca-se, outrossim, que, durante a vigência do regime militar, o primeiro procedimento de caráter repressivo foi a auto-censura. Mesmo durante as fases mais ostensivas do regime militar no Brasil, raros foram os jornais ou revistas submetidos a um controle do aparato de censura, a saber: O Estado de São Paulo e o Jornal da Tarde, entre os periódicos de referência nacional; entre os jornais considerados alternativos, a Tribuna da Imprensa, o Opinião, o Movimento e o Pasquim; além de O São Paulo, da Arquidiocese de São Paulo, e da revista Veja. Acrescenta-se ao controle exercido sobre os veículos de comunicação o fechamento do Última Hora e de O Correio da Manhã. Atos isolados de censura, por períodos breves - de alguns dias ou semanas -, atingiram muitos jornais alternativos, alguns periódicos regionais e o Jornal do Brasil, veículo de referência no Brasil.A maior parte da imprensa convencional do país, inclusive grandes jornais como O Globo e Folha de São Paulo, nunca sofreu atos de censura por parte de agentes enviados às redações pelo governo[10]. Um dos poucos veículos submetidos a essa espécie de censura, O Estado de São Paulo, acatou ordens dos censores, as quais eram comunicadas por telefone, até o momento em que se instaurou nesse periódico a censura prévia. Constata-se que O Estado de São Paulo operou a maior parte do tempo sob exercício de algum grau de auto-censura. A censura prévia, realizada por censor enviado à redação, só entrou em vigor nesse jornal em 12 de março de 1973, sendo abolida dois anos depois, em janeiro de 1975. A censura na revista Veja, por seu turno, durou cerca de dois anos e quatro meses, acabando em junho de 1976. Na chamada imprensa alternativa a censura prévia não apenas continuou como foi intensificada, findando somente em 1978.

Em contraste com o sistema abrangente, formal e duradouro implantado por Getúlio Vargas durante o Estado Novo, sob a égide do DIP (Departamento de Imprensa e Propaganda), o regime militar pós-1964, aplicava a censura prévia de modo circunstancial, e sem obedecer a regras claras. Assim, o próprio regime exercia a censura como um procedimento ilegal e ilegítimo, sem deixar registros formais de seus atos, mesmo após instituir o Decreto número 1077, no ano de 1970. Salienta-se, no entanto, que esses momentos e incidentes de censura ou intimidação foram muito freqüentes[11]. Desse modo, a falta de regras transparentes reforçava o controle da informação. Mantinham-se sob intimidação os proprietários dos meios de comunicação, sempre receosos de sofrerem prejuízos, pois tanto a censura prévia como o confisco de uma edição já impressa podiam representar grandes perdas às empresas jornalísticas.

Cabe ressaltar que a censura prévia mesmo limitada, como foi praticada nesses periódicos - introduziu um componente de imprevisibilidade, entre as fases de produção dos originais e sua reprodução comercial, difícil de ser superado no curto intervalo do ciclo jornalístico. Se a reportagem principal de uma edição fosse censurada, por exemplo, como substituí-la, rapidamente, por outra de igual densidade, atualidade e importância? O confisco era prejuízo certo porque a edição poderia, inclusive, deixar de ser vendida. A auto-censura, desse modo, eliminava tais riscos, que eram grandes no regime político inaugurado em 1964, caracterizado pela ambigüidade, por mudanças bruscas de humor e pela falta de regras objetivas acerca das matérias, reportagens e artigos que não poderiam ser publicados. Por outro lado, a censura prévia continuada e severa devastou os jornais alternativos: O Pasquim, Opinião, Movimento, O São Paulo, Tribuna da Imprensa e Politika[12].

Antecipando-se a esse tipo de represálias, muitas vezes imprevisíveis, e tentando adivinhar as idiossincrasias do sistema, jornalistas, editores e donos de jornais esmeravam-se na auto-censura, no controle antecipado e voluntário da informação. Esse exercício generalizado da auto-censura, estimulado por atos isolados de censura exógena realizados pela ação das Forças Armadas, determinou o padrão de controle da informação durante os primeiros dezessete anos de regime autoritário. Os demais métodos, inclusive a censura prévia e os sucessivos expurgos de jornalistas, figuravam, assim, como acessórios e instrumentos na implantação da auto-censura. Dessa forma, explica-se também o reduzido número de processos contra jornalistas durante esse período do regime militar[13].

A fase compreendida entre 1965 e 1968 é de recuperação acidentada da autonomia jornalística, à medida que, em todo o mundo, e também no Brasil, estudantes e segmentos médios da população protestavam, nas ruas, contra o sistema. Esse processo é interrompido com o AI5, que sinaliza aos barões da imprensa a nova etapa de consolidação do autoritarismo. Bernardo Kucinski (1991) registra que, pouco antes do AI-6, um editorial do jornal O Estado de São Paulo, o qual defendia certo grau de censura aos espetáculos, levara o editor do caderno de cultura do periódico, Décio de Almeida Prado, a demitir-se e a ingressar num período de silêncio jornalístico que duraria mais de trinta anos.

Os donos de jornais adaptaram-se rapidamente à nova situação, destruindo a autonomia que fora conquistada pelos jornalistas na fase anterior e que, obviamente, chocava-se com os rumos do regime militar. Demitiram jornalistas mais combativos e críticos e tornaram-se complacentes em relação às violências do regime. Na mesma semana do AI5, Alessandro Porro obteve a demissão de dirigentes da revista Realidade. Algumas semanas depois, Antônio Aggio substituiu Miranda Jordão na Folha da Tarde, e a redação se dissolveu. Niomar Muniz Sodré, proprietária do Correio da Manhã, recusou-se a promover um expurgo, mas, após dois atentados contra o jornal, ela foi presa, juntamente com o diretor superintendente Oswaldo Peralva e o diretor Nelson Batista. Em março daquele ano, o jornal pediu concordata e, em setembro de 1969, foi arrendado a terceiros, até, finalmente, desaparecer. Alguns meses depois, seria demitida a equipe de Veja responsável pelas capas sobre a tortura. Entre 1973 e 1974, foram fechadas três emissoras de rádio: Nove de Julho e Marconi, em São Paulo, além da Cultura, de Feira de Santana. A equipe de O Pasquim, por sua vez, foi presa por dois meses, em novembro de 1970, pelo DOI-CODI, o órgão mais brutal de repressão. Hélio Fernandes, diretor da Tribuna da Imprensa, muitas vezes, foi preso e confinado.

Celina Duarte (1987) mostra que foi, precisamente, o general Golbery que, em 1974, teve a idéia de chamar um grupo de jornalistas de prestígio para criar um discurso consensual com o intuito de justificar a adoção de um modelo específico de abertura política. Golbery começou por abolir a censura nos dois únicos veículos de grande circulação que ainda existiam, os jornais da família Mesquita. Logo depois, em 1976, caiu a censura em O Pasquim e na revista Veja. Assim, a imprensa transformou-se no principal mecanismo de articulação política durante o governo Geisel. Todavia, os proprietários de jornais continuavam temendo as represálias dos órgãos de repressão, num período em que as receitas obtidas com a publicidade comercial também haviam sofrido uma queda, aumentando a dependência dos veículos em relação a verbas do governo. Convém ressaltar que foram os quadros jornalísticos de direção, sobretudo os editores, muito mais do que os donos de jornais, que formaram uma rede de apoio à abertura. Ao mesmo tempo, o assassinato do jornalista Vladimir Herzog pelo DOI-CODI de São Paulo, em outubro de 1975, pôs em crise o jornalismo complacente dentro das redações. Desse modo, constata-se que a história da aliança idealizada pelo general Golbery, que aproxima um grupo de jornalistas da idéia de uma abertura política gradual, é fundamental para se entender o jornalismo brasileiro da ditadura, da transição e, por que não dizer, as características da política e da imprensa nos primeiros anos do século XXI.

Pode-se mensurar todo esse processo, focalizando, por exemplo, a trajetória de Tarso de Castro, um dos quadros da imprensa brasileira que, no final dos anos 1960, provocou transformações no jornalismo oficial, em virtude das novidades implantadas mediante a criação de O Pasquim, cujo “símbolo” era o rato Sig. Leia-se o que afirmou o próprio Tarso, em agosto de 1969, a respeito das cartas que os leitores enviavam para a redação de O Pasquim, desejando saber a “origem do Sig”: -Símbolo é a mãe - respondeu Sig ao ver uma dessas cartas, sendo tomado de grande revolta. O registro desse fato é importante: depois de certos acontecimentos, o intelectual brasileiro não raro é chamado de símbolo disso e daquilo, como coisa que neste País a gente ainda estivesse precisando de símbolos para dizer alguma coisa. Quer dizer: basta o cara pensar que logo é classificado de rato, como aconteceu com certo locutor de televisão.

Se fôssemos um País de tradição, naturalmente Sigmund já teria seu lugar na história, mas infelizmente estamos ainda na base do subdesenvolvimento (perdão, Dr. Roberto, eu quero dizer em vias de desenvolvimento) e, portanto, qualquer um se acha no direito de negar o valor do Sig. Alguém precisa, portanto, esclarecer que Sig é como Deus: negado, existe. (Sérgio Augusto e Jaguar, 2006, p.33) Tarso de Castro foi um “dois em um”. De um lado, destaca-se o profissional inventivo, audacioso, criador de publicações, rato de redação desde a adolescência, quando começou a trabalhar em O Nacional, diário fundado pelo seu pai, o deputado do PTB, Múcio de Castro. De outro lado, sobressai o personagem: o boêmio, que tomava vodca com limão no café da manhã; o conquistador que teve todas - ou quase todas - as mulheres que desejou, entre as quais Leila Diniz, Danuza Leão, a hoje baronesa Silvia Amélia de Waldner e Candice Bergen10; o indivíduo de amizades fidelíssimas com Chico Buarque, Caetano Veloso, Glauber Rocha, entre outros. Cardoso (2005) revela, a esse respeito: “[...] eu gostaria de ter sido jornalista naquela época, quando havia uma cumplicidade entre artistas e jornalistas”. Tarso de Castro (1941-1991) foi um homem do seu tempo, um tempo que parece ter acabado, ou, mais precisamente, se deslocado. E isso ocorreu, não por culpa sua ou de alguém em particular, mas porque o curso da história parece haver fechado as portas para jornalistas com o perfil de Tarso: combativos, (no sentido de indomável), polêmicos - de fato, e não caricatos -, idiossincráticos ele escrevia o que lhe dava na telha - e apaixonados - tratava-se de um indivíduo que atacava e ridicularizava os inimigos da hora, os quais podiam ter sido os amigos de ontem ou viriam a ser os amigos de amanhã. O jornalista Tom Cardoso, que escreveu Tarso de Castro -75 Kg de músculos e fúria, lançado em 2005, afirma que procurou fazer justiça ao personagem, um dos homens de imprensa mais polêmicos do país entre os anos 1960 e 1980: “apesar de ser um porra-louca, um homem de bar, Tarso era um profissional responsável, um fazedor de muitas coisas. Infelizmente, pouco se fala dele hoje”. Gaúcho de Passo Fundo, filho de um dono de jornal e cacique do PTB que era muito ligado pessoalmente a Leonel Brizola, Tarso herdou do pai o entusiasmo pelo jornalismo e a admiração por Brizola, paixões essas que se fundiram em vários momentos de sua curta trajetória. Não era, contudo, um “homem de esquerda”, como alguns até hoje pensam.

Aliás, Tarso de Castro não era nem de direita nem de esquerda; Tarso era Tarso, a tal ponto que não tinha sequer pejo de dizer que, com ele, era assim: para os amigos, tudo; para os inimigos nem a justiça. Do ponto de vista intelectual, dedicava escasso tempo a leituras de caráter filosófico e menos ainda a grandes elucubrações ideológicas; nem mesmo sobre o “socialismo moreno”, pregado por Brizola, ele teorizava. Preferia, como historicamente se sabe, ação à introspecção, e se a ação envolvesse sexo, qualquer outra coisa seria secundária, exceto situações realmente excepcionais. Suas relações com o PDT, partido criado por Brizola após perder a lendária sigla do PTB para Ivete Vargas, foram sempre superficiais. Assim, se era o PDT quem não o queria como liderança política, ou, se, ao contrário, era Tarso quem fugia de qualquer cargo ou função públicos que em nada lhe interessavam, não se pode afirmar com certeza. Seria possível dizer-se que Tarso pendia à esquerda apenas e tão-somente se considerados aspectos afetivos, ou seja, sua amizade pessoal com Brizola e/ou o “DNA” emocional paterno, também intimamente ligado ao carismático líder gaúcho. Desse modo, no que se refere a sua posição política, Tarso era considerado comunista pela ditadura militar, mas “somente” um “brizolista” pela esquerda brasileira. Comunista ou socialista, Tarso não era. E o que era, naqueles tempos, um “brizolista”? Para além da definição lógica - isto é, um indivíduo seguidor das idéias de Leonel de Moura Brizola, outra praticamente inexistia. Getúlio Vargas, no Brasil, e Domingos Perón, na Argentina, tal como Brizola, arregimentaram milhões de seguidores, da direita à esquerda, sem que, sob as denominações “getulista” ou “peronista”, houvesse alguma doutrina política; o que havia, de fato, eram as idéias pessoais de ambos os caudilhos sobre como deveria ser a vida política. Por esse motivo, Tarso passava, frequentemente, a impressão de ser uma pessoa autoritária. Talvez ele, realmente, o fosse, não só porque nascera e se criara à sombra do “trabalhismo” de Vargas, que atingiu seu ponto máximo entre 1937 e 1945, com a criação do “Estado Novo” no país - uma ditadura de caráter populista -, mas também porque “o velho Múcio”, seu pai - jornalista sem papas na língua e ex-deputado estadual pelo PTB de Getúlio, Jango e Brizola possuía a forte personalidade que caracterizava os líderes sul-rio-grandenses, indubitavelmente, legada ao filho mais velho. Daí o epíteto de “porra-louca”, que foi conferido a Tarso de Castro por Tom Cardoso.

Tarso nasceu em 1941. Na adolescência, já incomodava, adotando um estilo sarcástico ao escrever textos para O Nacional. No final dos anos 1950, Passo Fundo ficou pequena, e Tarso mudou-se para Porto Alegre, a fim de trabalhar na sucursal gaúcha do Última Hora, o jornal de um de seus ídolos, Samuel Wainer, outro getulista “dos quatro costados”. Como repórter de política do periódico, viajou para Montevidéu, onde entrevistou Che Guevara. A foto em que aparece ao lado do líder guerrilheiro serviu para que ele contasse a Candice Bergen[14] a história de que havia chegado a Havana ao lado dos revolucionários, em 1959. Ela acreditou e se encantou por ele. No início dos anos 1960, logo depois da campanha da Legalidade, já estava no Rio de Janeiro, ajudando na campanha de Leonel Brizola e chefiando a redação do Panfleto, jornal que dava sustentação ao projeto político do ex-governador gaúcho.Também atuou no Última Hora, onde conquistou uma coluna em que ironizava ou atacava até mesmo os militares. Em 1969, ajudou a criar o mais importante dos jornais de esquerda surgidos durante a ditadura, o periódico intitulado O Pasquim. Sobre o nome do mais famoso tablóide brasileiro de todas as épocas, uma observação se faz necessária: é muito provável que o referido título tenha sido sugerido por Tarso. Ele - assim como quase toda a cidade de Passo Fundo (RS) - nasceu e cresceu ouvindo seu pai chamar o periódico que concorria com o dele de “pasquim”, querendo dizer, com isso, que “o outro” era apenas um arremedo de jornal. E Tarso, com certeza, não iria desperdiçar a excepcional oportunidade que lhe surgia para pôr em ação sua veia sarcástica.

De acordo com Tom Cardoso (2005), Tarso foi convidado para substituir Sérgio Porto como editor de A Carapuça, que se transformaria, logo em seguida, em O Pasquim, o grande catalisador de informações, de jornalistas e de leitores. Hoje, no entanto, mesmo alguns que tiveram uma participação pouco expressiva em O Pasquim são mais associados ao jornal do que Tarso de Castro, afirma Tom Cardoso. Dos dois mais notórios desafetos de Tarso dessa época, o autor de sua biografia conseguiu entrevistar apenas um deles, Ziraldo, pois Millôr Fernandes não respondeu à solicitação de Tom Cardoso. Millôr acaba sendo descrito no livro como uma espécie de vilão, em especial porque foi o único prócer de O Pasquim a quem os militares não colocaram na prisão. A carreira jornalística de Tarso teve outros grandes momentos no jornal Folha de São Paulo, ao qual esteve vinculado em três diferentes ocasiões: entre 1975 e 1977, quando foi editor do caderno Ilustrada e criou o Folhetim, suplemento dominical lançado em 23 de janeiro de 1977 que foi revolucionário para a época, em termos de linguagem jornalística, contendo grandes entrevistas, perfis, reportagens e textos assinados por colunistas de peso, que tratavam de política, cultura e comportamento; entre 1982 e 1985, quando assinou uma coluna, muito apreciada pelos leitores, no caderno Ilustrada; na Folha da Tarde, periódico vinculado à Folha de São Paulo, trabalhou entre 1988 e 1991. Inicialmente, conquistou a admiração do dono do jornal, Octavio Frias de Oliveira, e de Claudio Abramo, diretor de redação, mas, durante sua segunda passagem pelo veículo, não concordou com as mudanças que vinham sendo implantadas e acabou perdendo sua coluna em virtude de “divergências com as concepções jornalísticas em prática na Folha”, conforme nota do próprio periódico e reproduzida no livro de Cardoso. Em sua obra, Tom Cardoso não omitiu as características mais conhecidas de Tarso. Pode-se encontrar, na biografia, adjetivos como “irascível”, “incontrolável”, “inconciliável”, “intransigente”, “inveterado alcoólatra” (“Prefiro viver pela metade por uma garrafa de uísque inteira a viver a vida inteira bebendo pela metade”, teria afirmado o jornalista gaúcho). “Tarso ia a campo, conseguia muitas pautas e entrevistas no bar”, revela Tom Cardoso. A admiração do biógrafo pelo personagem, muitas vezes, faz com que as versões do próprio Tarso acerca dos temas então em voga sobressaiam aos fatos, ainda que, não raro, exista um tanto de folclore nessas versões. Porém, esse procedimento também confere paixão ao relato sobre um homem que sempre foi passional e que, em várias situações, partia para a briga sem se importar em saber quem sairia mais ferido - o adversário ou ele próprio. Tarso de Castro foi um dos protagonistas dos últimos capítulos da história de uma imprensa que não existe mais, a do jornalista polêmico e/ou desaforado - que gostava de chamar a militância do Partido dos Trabalhadores de “as normalistas do PT” , parcial - ele se posicionava, quase sempre, ao lado de Brizola - e idiossincrático, embora tal atributo pudesse ser confundido com incoerência. Tarso comprava brigas, das quais, embora não confessasse, poderia se arrepender no momento seguinte.

O conflito mais notório dentre aqueles em que foi obrigado a voltar atrás, ele estabeleceu com Tancredo Neves. Em artigos, Tarso chegou a dizer que o ex-governador mineiro deveria ter herdado o revólver, e não a caneta de Getúlio Vargas. Porém, depois que ambos se conheceram, Tarso mudou radicalmente de opinião a respeito de Tancredo Neves. Entre os ódios eternos que cultivou, o mais forte foi aquele que nutriu por seu ex-colega de O Pasquim, Millôr Fernandes, que, em sua opinião, “era um homem corroído pela inveja e pela cobiça pelo poder”. Millôr afirmara que Tarso “roubava o jornal” para sustentar o vício da bebida.

Durante a curta história de O Pasquim, ocorreram episódios folclóricos, muitos provavelmente criados por amigos de Tarso, para fortalecer sua imagem de jornalista inteligente, o que ele, efetivamente, era. Um dos episódios contatos por seus amigos é o de que fora de Tarso a idéia de substituir cada palavrão dito por Leila Diniz (e foram dezenas), na sua histórica entrevista ao jornal, pelo símbolo do asterisco. Há sérias dúvidas sobre a veracidade dessa versão, e mais ainda daquela segundo a qual os censores da ditadura demoraram “vários meses para entender a criação de Tarso”. É esse personagem, uma mistura de boxeador com camicase, que emerge das duas biografias -Tarso de Castro: editor de “O Pasquim”, de autoria de Sônia Bertol (2001), e Tarso de Castro - 75 Kg de músculos e fúria: a vida de um dos mais polêmicos jornalistas brasileiros, do também jornalista Tom Cardoso (2005). O título deste último livro foi extraído da frase que o próprio biografado sempre utilizava para dar início a um texto (“Neste momento, 75Kg de músculos e fúria se reúnem para escrever mais uma coluna”).Percebe-se que O Pasquim foi o divisor de águas na vida de Tarso de Castro e vice-versa. Um não teria existido sem o outro. Foi Tarso o principal catalisador do grupo reunido em torno do projeto do periódico; o homem que se sentia no direito de enquadrar Paulo Francis, Ziraldo, Jaguar, Luiz Carlos Maciel e Millôr. Por seu turno, foi O Pasquim que deu visibilidade a Tarso, criando o mito do jornalista que dava expediente no Antonio’s, bar carioca - sem nunca pagar a conta -, e que alimentava suas fontes nas madrugadas do Leblon e nas areias de Ipanema.

Depois que saiu de O Pasquim, Tarso valeu-se da amizade de Chico Buarque de Holanda, Martha Alencar, Eric Nepomuceno e Claudio Abramo para se aventurar na criação de outros periódicos, como o Jornal de Amenidades , o Enfim, o Folhetim e, por último, para fundar uma filial de O Nacional no Rio de Janeiro[15]. Em todos esses veículos, deixou sua marca de ironia e humor corrosivo, e, tendo vivido intensamente, partiu cedo demais. Nem mesmo o casamento com a fotógrafa Gilda Barbosa e o nascimento do filho João Vicente, em 1983 - a quem dedicou o livro Pai solteiro e outras histórias -, fizeram com que Tarso mudasse seu comportamento em relação à bebida. Nos últimos meses de vida, foi internado dezenas de vezes, a ponto de ninguém mais acreditar na sua recuperação, até morrer de cirrose hepática, em maio de 1991, aos 49 anos de idade. Nesses tempos de espetacularização da corrupção, sobretudo no âmbito da política nacional, falta à população, ao que parece, um jornal de informação que busque, por intermédio do humor “anárquico”, contextualizar e criticar o que está ocorrendo no Brasil. É justamente nessas horas que se costuma lembrar de O Pasquim. Lançado em 26 de julho de 1969, pelo jornalista Tarso de Castro, o jornal seria uma das grandes forças contra a repressão política da ditadura militar nos anos 1970. Com a tiragem inicial de 20 mil exemplares por semana, o periódico chegaria na metade da década de 1970 a 200 mil cópias. Tratando de assuntos até então considerados tabus, como divórcio, sexo, drogas, aborto e feminismo, e reunindo uma das melhores equipes da história da imprensa nacional[16], O Pasquim foi aclamado como ícone de um tempo e passaria a influenciar vários jornais alternativos nas décadas seguintes, os quais auxiliaram na crítica política e social, sobretudo, no período de abertura e da Campanha das Diretas Já, em 1984. Assim, a relevância política alcançada por O Pasquim, faz passar despercebido ou, pelo menos, oblitera um dado curioso, omitido por muitos daqueles que escrevem sobre o tema: o jornal era deficitário, não obstante o extraordinário aumento da sua tiragem em menos de cinco anos[17]. Quando Tarso foi substituído por Sérgio Cabral na direção do periódico, no final de 1971, a dívida da empresa jornalística beirava, segundo informações disponíveis, os trezentos mil dólares, e viria a ser saneada somente na gestão de Millôr Fernandes.

O governo militar sempre almejara pôr um fim a O Pasquim, mas não imaginava que vários artistas e intelectuais iriam se reunir para mantê-lo funcionando. Ironicamente, a vitalidade e a grande força desse periódico vinha, justamente, de sua postura crítica em relação à realidade social daquele período ditatorial. Nos anos de 1980, década que marca o final do regime militar no país, o jornal, que até então tivera uma excelente tiragem, começava a perder espaço. A queda das vendagens foi tão intensa que, a partir de 1982, o veículo já não despertava o mesmo interesse, cedendo lugar, na preferência dos leitores, para revistas como Chiclete com Banana e outras publicações. O Pasquim encerraria sua história em 11 de fevereiro de 1991 (poucos meses antes da morte de Tarso de Castro). Naquele momento, só restara, da equipe original, o desenhista Jaguar. Tentando recuperar a magia dos velhos tempos, Ziraldo, em 2001, financia o relançamento de O Pasquim, então com o nome de Pasquim 21. O jornal volta a contar com bons jornalistas, e com alguns de seus antigos colaboradores, porém não consegue obter a mesma química dos anos 1970, acabando, definitivamente, em 2004.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ABRAMO, Cláudio. A regra do jogo. São Paulo: Cia das Letras, 1988. AQUINO, Maria Aparecida de. Censura, imprensa, estado autoritário: e o exercício cotidiano da dominação (O Estado de São Paulo e Movimento). São Paulo, dissertação de mestrado, USP, 1990.

BERTOL, Sônia. Tarso de Castro: editor de “O Pasquim”, Passo Fundo (RS): UPF, 2001. BOURDIEU, Pierre. L’illusion biographique. Actes de la Recherche en Sciences Sociales, (6263), p. 69-72, juin,1986.

DE CERTEAU, Michel. The practice of everyday life. Berkeley/Los Angeles/Londres: University of California Press, 1984.

CARDOSO, Tom. Tarso de Castro - 75 Kg de músculos e fúria: a vida de um dos mais polêmicos jornalistas brasileiros. São Paulo: Planeta, 2005.

CASTRO, Tarso de. Pai solteiro e outras histórias. São Paulo: Laser Press, 1990.

DUARTE, Celina Rabello. Imprensa e democratização no Brasil. São Paulo, dissertação de mestrado, PUCSP, 1987.

KRISCHKE, Jair. Entrevista na TV-COM (RBS), março de 2004.

KUCINSKI, Bernardo. Jornalistas e revolucionários: nos tempos da imprensa alternativa. São Paulo: Scritta Editorial, 1991.

MARCONI, Paolo. A censura política na imprensa brasileira: 1968-1972. São Paulo: Global, 1980.

ORWELL, George. A revolução dos bichos. São Paulo: Abril Cultural, 1982.

___ . Dias na Birmânia. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1984.

___ . 1984. 18. ed. Tradução de Wilson Velloso. São Paulo: Nacional, 1984.

SÉRGIO AUGUSTO; JAGUAR (Org.). O melhor do Pasquim. Rio de Janeiro: Desiderata, 2006.

Referências

  1. Mauro Gaglietti é Doutor em História/PUCRS, Professor e Pesquisador da Faculdade Meridional (IMED), em Passo Fundo (RS), Professor Colaborador do Mestrado em Direito da Universidade Integrada do Alto Uruguai e Missões (URI), em Santo Ângelo (RS) e Professor do Instituto Menino Deus (IMD) em Passo Fundo (RS) – E-mail: maurogaglietti@via-rs.net
  2. Márcia Helena Saldanha Barbosa é Doutora em Letras/PUCRS, Professora e Pesquisadora do Curso de Graduação em Letras e do Mestrado em Letras (PPGL) da Universidade de Passo Fundo (UPF), e também autora de vários artigos, ensaios e livros. E-mail: marciabarbosa@via-rs.net
  3. Carlos Alceu Machado é Advogado e integrante da Academia Passo-Fundense de Letras.
  4. Publicado na revista Água da Fonte n° 06
  5. No mesmo sentido, o sociólogo Pierre Bourdieu (1986, p.70), criticando o método das histórias de vida, opôs-se ao que chamou de “ilusão biográfica”. Para o sociólogo, os pesquisadores que utilizam esse método geralmente partem de uma noção de identidade “entendida como constância a si mesmo de um ser responsável, ou seja, previsível ou pelo menos inteligível”, oposto ao “sujeito fracionado, múltiplo” da realidade.
  6. Ver biografias de Tarso de Castro escritas por Sônia Bertol (2001) e por Tom Cardoso (2005).
  7. José Maria Rebele, editor do Binômio, estava na lista dos primeiros exilados, além de Ivan Lessa, Tarcísio Lage, Arthur José Poerner, Oswald Peralva e Hermano Alves.
  8. Alguns analistas situam o fim do ciclo autoritário em 1989, quando ocorreu a eleição direta para presidente da República.
  9. KRISCHKE, Jair, 2004, p.4.
  10. KUCINSKI, Bernardo, 2002, p. 533-552.
  11. O levantamento das matérias censuradas de O Estado de São Paulo e do Movimento, feito por Maria Teresa Aquino (1990), mostra que os censores suprimiram informações em vários campos, especialmente os referentes a violações de direitos humanos, mas atingindo, em média, uma matéria apenas, a cada quatro dias. Também a amplitude e freqüência dos bilhetinhos e telefonemas aos jornais sobre temas proibidos ou sensíveis, conforme o levantamento de Paolo Marconi, sugere uma intensa atividade por parte da censura. Ver Marconi, 1980.
  12. Ver Kucinski, 1991.
  13. Apenas quinze jornalistas foram processados por crimes de imprensa, a maioria em casos ligados a denúncias de corrupção ou de mandonismo. Hélio Fernandes, a equipe de O Pasquim e jornalistas do Coojornal foram presos ou confinados por períodos curtos.
  14. Comenta-se que, “nesse setor” – modo como se falava à época -, até o carrancudo Paulo Francis tentou ciscar no quintal de Tarso, contraindo uma paixão não correspondida pela belíssima Bárbara Oppenheimer, primeira esposa do jornalista gaúcho.
  15. Sobre a viabilidade jurídica desse projeto, chegou a consultar Carlos Alceu Machado, tendo como intuito evitar as despesas e os trâmites burocráticos que adviriam da fundação de um novo jornal
  16. O “Dream Team” do jornalismo brasileiro era composto por Tarso de Castro, Paulo Francis, Jaguar, Millôr Fernandes, Paulo Garcez, Sérgio Cabral, Luiz Carlos Maciel, Fortuna, Henfil, Ziraldo, Tárik de Souza, Ruy Castro, Fausto Wolff, entre muitos outros.
  17. Outro fato inédito no jornalismo brasileiro, no que se refere a jornais com grande tiragem e amplo círculo de leitores: O Pasquim, nos seus primeiros longos anos de vida, não aceitava publicidade.