Eu quero voltar

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Eu quero voltar

Em 30/09/2002, por Heloisa Goelzer de Almeida


Eu quero voltar

Heloísa Almeida[1]


Eu quero voltar...

Ao meu torrão muito amado,

para ver as manhãs de sol,

com cigarras no arvoredo

e andorinhas no beiral...

Eu quero voltar...


Escutar a voz do carreteiro

que pelo caminho vai levando,

a carreta que ringindo

vai pouco a pouco sumindo

numa volta lá da estrada...


Eu quero voltar...

Veros campos em queimada,

coxilhas esfumaçadas,

caranchos em revoada

procurando cobras daninhas...


Eu quero voltar...

Para ver ao meio-dia

com sol quente, bem a pino,

na encosta do capão,

o gado pachorrento

esperando a tarde amena...


Eu quero voltar...

Ver o capão de timbós,

a curva lá da estrada,

onde ao longe se avistava

a casa dos meus avós...


Eu quero voltar...

Ver a ponte do Rio Tigre,

a casa do seu Apolinário,

a serra logo ali perto,

que com certeza... por certo,

hoje é um descampado...


Eu quero voltar...

Para ver a passarela

que a tarde em chilreiada,

cantam ao pôr do sol

um hino ao Criador...

Eu quero voltar...


Ver o gramado de mal-me-queres,

e o cinamomo florido,

onde nos galhos mais baixos

compadre Amâncio amarrava,

as rédeas de seu cavalo...


Eu quero voltar...

Ver o cerro, e lá em baixo

o campo verde, florido,

as avestruzes andando

vaidosas e altaneiras

e os butiazeiros com caixos...


Eu quero voltar...

Ver as noites enluaradas

céu azul todo estrelado,

escutar lá longe alçado

o grito de um graxaim...


Eu quero voltar...

Prá despertar de madrugada

quando alegre a passarada

canta, saudando o sol,

fazendo coro com o galo

que também lhe diz bom-dia...


Eu quero voltar...

Acordar tarde da noite,

escutara chuva...

caindo como um açoite

e o minuano batendo

a porta lá do galpão...


Eu quero voltar...

Ouvir goteira pingando

em noite de chuvarada

e até cachorro uivando

que dizem explicando

alma a outro mundo enxergar...


Eu quero voltar...

Veras matas verdejantes,

pitangueiras, guamirins,

borboletas coloridas, esvoaçantes

o regato que correndo,

murmúrios vai levando...


Eu quero voltar...

Escutar nas noites calmas

o canto da coruja

e o coaxar dos sapos na lagoa...

isto tudo eu quero ouvir,

pois a saudade, não escolhe o querer...


Eu quero voltar...

Ver em tardes de primavera

lua-luas no gramado,

pessegueiros floridos,

bem-te-vis cantando neles


Eu quero voltar...

A querência muito amada,

linda e buena no mas,

dizer a ela, entre risos e lágrimas

de que embora gaudéria, arrinconada

cada vez amá-la mais...


Eu quero voltar...

Em cada lugar lembrar

Sua Rosa e a Nóca,

Compadre Juca, Polidoro, seu Joaquim

Morais e Benvindo e o Lincindo.

e tantos outros mais...


Eu quero voltar...

Para ver no cemitério

por sobre as lápides, gravados

os nomes dos conhecidos

que partiram para outra vida,

já não estão mais lá...


Eu quero voltar...

gritar nos campos floridos

coxilhas, canhadas, matas e capões,

para tudo de lá enfim,

de que, aqui na cidade

a saudade é sem fim...


Eu quero voltar...

Escutar de novo vozes...

ringir de rodas, berro de boi

andorinhas, quero-quero

tudo numa vozeirada

cantando em coro para saudar

à mim, que quis voltar...

Referências

  1. Presidente do Comitê da Cidadania de Combate a Fome a Miséria e pela Vida