Ponte do Rio Passo Fundo

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Ponte do Rio Passo Fundo

Em 21/09/1952, por Celso da Cunha Fiori


Recordar é viver

Programa levado ao ar na Rádio Passo Fundo – ZYF-5

Data: 21 de Setembro de 1952


Redigido e apresentado por Celso da Cunha Fiori

I

Os músicos também tem as suas anedotas, as suas histórias, a sua gíria. Parece que guardam, mais do que todos, reminiscências de suas tocatas, das suas serenatas, da sua boemia. Músicos, cantores e boêmios formaram sempre uma espécie de irmandade, de congregação.

Quando casei-me, no inverno de 1930, vim morar no Boqueirão, perto do Instituto Educacional, (Av Brasil Oeste 1489 - Boqueirão - Villa Berthier)na atual Residência do Sr. Álvaro Berthier. Na noite da chegada fui alvo de uma grande serenata, organizada pelo Pedrinho Barreiro, hoje notário em Palmeira, e que, naquele tempo, era gerente do Hotel Avenida. Executaram vários números de música, e, por fim, tocaram numa vitrola um grande tango.

Desta época é o nosso companheiro Quinquinha. Guardou alguns episódios e contou-me este: “Havia aqui um cidadão de nome Alberto Anibeli que fazia parte de um conjunto ao qual também pertencia um conhecido músico, Sr. Adirino DiPrimio, , pai de Nino Di Primio, co-proprietário do Posto Shell desta cidade. Numa das costumeiras tocatas lá para os lados do Boqueirão foram fazer uma serenata na casa de um amigo. Anibeli, que era meio pixote, começou a desafinar e o velho Di Primio chamou-lhe a atenção. Mas como os músicos também sabem achar desculpas o Alberto Anibeli retrucou: “Como você quer que eu toque de ouvido no escuro?”

Isto. Abram bem as janelas do estúdio que os nossos velhos amigos daquele tempo vão tocar a valsa “Aniversário fatal”.

II

A ponte existente sobre o Rio Passo Fundo, no extremo da Avenida Capitão Jovino, tem para mim uma explicação e uma história. Ou por outra, creio ter desvendado os motivos da sua construção durante a gestão primeira do então Intendente Municipal, Sr. Armando Annes.

Este respeitável cidadão foi em outros tempos um moço da moda, de grande destaque na sociedade, já pelas suas qualidades, já pela sua origem, filho que era do Coronel Gervásio Annes, vulto proeminente da história do município. Dizem que foi muito galanteador, com grandes conquistas. Viajou pela Europa, conheceu Paris, tinha cavalos de corrida e gostava de bailes.

Como tivesse residência do outro lado do “Passo” e freqüentava os bailes que se realizavam deste lado da cidade, contam que mandou fazer uma pinguela com um pinheiro para poder atravessar o rio nestas noites de baile. Não havia naquele tempo nem ponte, nem iluminação, nem calçamento.

O Sr. Armando Annes comprou para um dos bailes um sapato branco, coisa fina e elegante que só o Volcato seria capaz de fazer. Mas ao atravessar, com todo o cuidado a sua pinguela, perdeu o equilíbrio e caiu dentro d´água.

Este episódio, que as pessoas daquela época ainda contam, deve ter sido o motivo determinante que levou o Sr. Armando Annes a construir aquela ponte logo que assumiu o cargo de Intendente do Município, fazendo obra dispendiosa e duradoura.

As mulheres tem presidido, através dos tempos, os destinos do mundo. Porque não influiriam na história administrativa de Passo Fundo?      

Wordel e seus companheiros, que estão acenando com a cabeça para confirmar que o fato é verdadeiro, vão tocar o choro “Vai agora

III

Já que abordamos este assunto sobre a história da ponte do “Passo” não podemos fugir da oportunidade de apresentar mais uns dados interessantes sobre ela. Antes, porém, devo confessar que o Sr. Armando Annes nega peremptoriamente sejam aqueles motivos relatados as razões para a construção da ponte. Devemos entretanto observar que o coração tem razões que a própria razão desconhece.

Em seu relatório apresentado em 1º de Novembro de 1928, o então intendente justifica a construção daquela ponte, que custou uma fortuna (cinqüenta e dois contos, trezentos e oitenta e dois mil e setenta e quatro réis), como conseqüência imperiosa de estar o Matadouro Municipal localizado do lado de lá do Rio Passo Fundo. O certo é que ali existia uma ponte de madeira, com armação de lei

A atual ponte foi construída em 3 anos. Foram gastas 310 barricas de cimento, 418 metros cúbicos de pedra e 258 quilos de ferro. Foi primeiro contratada a sua construção com o Engenheiro Dante Mosconi, que não pode terminá-la, o que foi feito por administração da Seção de Obras do Município.

Fizeram-se críticas violentas pela excessiva despesa com este melhoramento, mas o certo é que a ponte está ali , como obra incontestável de necessidade pública. A crítica não deteve o administrador daquela época. Sirva isto de exemplo aos novos administradores: ninguém deve deter-se na execução de obras capazes de se projetarem no futuro.

Os seresteiros do nosso programa já estão prontos para brindá-los com uma de suas belas valsas “Pisando Corações”, em homenagem que presta Joaquim de Almeida Costa à Srta. Maria Ibes Berthier, pelo seu aniversário.

IV

E já que falei de críticas, lembro-me de uma que bem revela o espírito fustigante dos passofundenses , mesmo ante as coisas elogiáveis que fazem as administrações municipais.

O serviço de de remoção de lixo da cidade era feito antigamente por duas carroças de tração animal. Não estava mais de acordo com o progresso da cidade e nem satisfazia as exigências do serviço.

Foi então que a municipalidade comprou um caminhão Chevrolet, usado, do Sr. Pedro Lopes de Oliveira Filho, já falecido, pelo valor de 8 contos de réis. Mandou reformá-lo e adaptá-lo para o serviço de remoção do lixo.

As críticas não poderiam faltar. Passou-se a dizer que em todas as cidades tinha um “caminhão de lixo”, mas Passo Fundo tinha um “caminhão de luxo”!

E há ainda gente que aspira ser prefeito.

Isto me faz lembrar aquela história de uma cidade árabe em cuja praça estava um homem enforcado e ao lado dele um bolo de gente brigando. Um forasteiro perguntou o que era aquilo e foi informado:

“Foi o governador da cidade que foi enforcado. Há muitos anos é assim que os governadores terminam seus mandatos”.

E aquela gente brigando, o que é, perguntou o turista?

E o árabe respondeu: “São os que estão lutando para substituí-lo”


Como seu último número, os nossos amigos dos velhos instrumentos e das antigas músicas vão tocar a marcha “Bandeirantes”