História da Medicina em Passo Fundo, Dados relevantes

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História da Medicina em Passo Fundo, Dados relevantes

Em 2008, por Marco Antônio Damian


História da Medicina em Passo Fundo – Dados relevantes[1]


O primeiro “médico” de que há notícias em arquivos locais, entre 1842 e 1845, foi o cidadão Casemiro Antônio Bastide, anunciado como “cirurgião aprovado”, que prestou relevantes serviços ao povoado. Naquele tempo a medicina era caseira, empregando-se a benzedura, cataplasma, emplasto, ungüento feito com sebo do boi e infusões de ervas. À sangria era aplicada a sanguessuga. Valendo como registro, em 1850, o Juiz-subdelegado Cesário Antônio Lopes, recebeu o pedido do senhor Francisco de Souza Neves, que, vindo de Cruz Alta, queria exercer em Passo Fundo a profissão de Professor em Medicina. Teria licença, para essa finalidade, da Câmara de Cruz Alta. Mas, como não apresentou esse documento, lhe foi negado o pedido. Nessa época, quando um passo-fundense dispunha de recursos, mandava chamar um médico de Cruz Alta para atendê-lo. Um deles foi o Dr. Francisco Antônio da Rosa, em 1855, conforme registro no livro “As Missões Orientais”, de José Veloso da Silveira.

Em Passo Fundo, entre os anos de 1850 e 1860, clinicou o senhor Jorge Moojen, que também exercia as funções de Delegado de Polícia, Inspetor de Ensino e outras atividades. Em 1859, um ofício, anexado ao Livro de Requerimentos Públicos da Intendência Municipal, expedido por Inácio Alves do Nascimento, solicitava licença para receitar remédios caseiros. Anexo ao ofício uma lista de assinaturas de pessoas que comprovavam a competência e lisura do requerente. O pedido foi despachado favoravelmente.

A Saúde Pública em Passo Fundo, segundo registros de relatórios municipais, foi criada em 1902. A municipalidade interessou-se pelo assunto, até então fora de cogitações, pelo sensível acréscimo da mortalidade nos primeiros dez meses daquele ano. Nada menos do que 48 óbitos, contra 21 do ano anterior. Um aumento absolutamente desproporcional ao do número de habitantes. Desta forma, o médico Custódio de Souza, sensibilizado com a funesta realidade, colocou à disposição do serviço público seus préstimos profissionais, gratuitamente. As doenças cardíacas e a bronquite eram as principais ‘causa mortis’.

Apesar da natural salubridade desta região, favorecida pelo clima, pela altitude e mesmo pela sua topografia, não tardaram a aparecer moléstias até então desconhecidas, trazidas especialmente por viajantes, as quais exigiam um serviço mais intenso de profilaxia. A varíola, por exemplo, irrompeu em Passo Fundo, em 1905, obrigando a Intendência a tratar do serviço de vacinação, no que foi, gratuitamente, auxiliada pelos senhores Gezerino Lucas Annes, Oscar Pinto de Morais, Arnaldo Luiz Hoffmann, Roberto Cunha da Silva e Orozimbo Silva. Essas pessoas, membros da comunidade, em sua maioria exerciam a medicina e a farmácia de forma prática, uma vez que a própria Constituição do Rio Grande do Sul, de inspiração positivista, permitia o livre exercício dessas profissões. Em seu art. 71, parágrafo 5, trazia a seguinte redação: “Não são também admitidos, no serviço do Estado, os privilégios de diplomas escolásticos ou acadêmicos, sendo livre, em seu território, o exercício de todas as profissões de ordem moral, intelectual e industrial”. Os positivistas adotavam um lema filosófico: “Viver às claras”, e, no plano prático, as pessoas pregavam o exercício empírico da profissão. Sobre isso disse o Professor Dr. Martim Gomes, Catedrático de Clínica Ginecológica da Faculdade de Medicina de Porto Alegre, no livro “Panteão Médico Rio-grandense – Síntese, Cultura e História” (Ramos, Franco Editores, São Paulo, 1943): “É um erro comum pensar que o curandeiro milagroso não cura. É um erro pior julgar que ele cura com os remédios que dá, quando a causa da cura é sua personalidade, sua fé. É um erro, porém, perniciosíssimo, partir do fato de que essas curas são devidas à ação espiritual, em condições particulares, para ir até o ponto monstruoso da chamada liberdade de profissão, tal como dominava no Rio Grande do Sul”.

Em 1906, com a finalidade de socorrer os flagelados pela seca e pela praga do gafanhoto, foi criada, em Passo Fundo, a Liga Protetora dos Pobres. Dois anos depois grassou também, em caráter epidêmico, pela primeira vez, a doença da varicela, alarmando a população. Nova campanha de vacinação foi disponibilizada, desta feita comandada pelo Dr. Nicolau de Araújo Vergueiro, o primeiro médico passo-fundense a se estabelecer na cidade, formado, em 1905, na primeira turma da Faculdade de Medicina de Porto Alegre, em Farmácia e Medicina. Valendo como registro, convém dizer que a Faculdade Livre de Medicina de Porto Alegre, foi criada em 1898, de uma fusão da Escola de Farmácia e do Curso de Parteiras. Possuía os cursos de Medicina, Farmácia, Odontologia e Obstetrícia.

O jornal O Gaúcho, editado em Passo Fundo, em sua edição nº 23, de 26.6.1910, publicou a nominata do Corpo Médico que atendia na cidade. Era composto pelo Dr. Nicolau de Araújo Vergueiro, Dr. Alfredo Bruno de Campos, formado pela Academia de Medicina de Nápoles, com revalidação do diploma pela Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, e Dr. José Maria Gomes, formado pela Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro. E os médicos Práticos, Roberto Cunha da Silva, Gezerino Lucas Annes e Romão Lopes da Rosa. Vale salientar que, Gezerino Lucas Annes mantinha uma clínica homeopática, na Rua Paissandu nº 49, “com mais de 30 anos de prática”, como anunciava o jornal O Gaúcho, na edição nº 34, de 7.9.1911. E Romão Lopes da Rosa, “especialista em moléstias de crianças, cura angina, crupe, meningite, coqueluche, hidropisia, em qualquer grau que se encontra, por um processo de sua descoberta, doença esta até hoje incurável, assim como cura asma, bronco-pneumonia e todas as moléstias venéreas e sifilíticas. Com mais de 30 anos de prática, possui consultório contíguo à Farmácia Borges da Rosa, na Rua Moron” anunciava o jornal O Gaúcho, edição nº 18, de 22.5.1910. Assim, após a primeira década do século XX, Passo Fundo era atendida por três médicos e três práticos, que se arvoravam à Medicina, pelos longos anos do seu exercício. Porém, a convivência entre eles era pacífica e respeitosa.

Dois anos mais tarde, mais um médico chegava à cidade. Tratava-se do Dr. Manoel Perez Hervella, diplomado pela Universidade de Valladolid, na Espanha, e pela Faculdade Médica do Porto, em Portugal, com 40 anos de atendimento em hospitais e clínicas da Europa. Atendia na Rua General Osório, junto ao Máximo Bolner. Igualmente o Major Guilhermino Fernandes, prático em Medicina e Farmácia, oferecia seus serviços profissionais à população passo-fundense. Dizia ele que, além de cirurgião da Brigada de Infantaria do Estado, por mais de 30 anos, atendia no foro, fazia arrolamentos, inventários e partilhas. Às pessoas pobres, o atendimento era gratuito, tanto na área Médica, como no Direito. Residia à Rua do Comércio, hoje Avenida Brasil, atendendo somente nas ocasiões em que se achava desocupado dos serviços de seu cargo militar. O anúncio foi veiculado no jornal O Gaúcho, nº l, ano IX, de 4.1.1912. Essas referências servem para demonstrar a facilidade ao livre acesso profissional. O Major Fernandes era tanto médico prático quanto rábula (advogado não diplomado).

Em 1914, por iniciativa do senhor Antonino Xavier de Oliveira, que reuniu parte da sociedade de Passo Fundo, foi criado o primeiro nosocômio, chamado Hospital de Caridade, que passou a funcionar, de forma ainda precária, em 1918, e em prédio próprio, em 1920.

A propagação, já adiantada em nosso ambiente, de uma enfermidade mais grave, a tuberculose, sobressaltou a municipalidade, que criou, de forma profissional, a rubrica Assistência Pública, em 1915. O primeiro médico que ocupou o cargo foi o Dr. Fernando de Carvalho, formado pela Faculdade de Medicina de Porto Alegre, em 1913, que havia chegado à cidade um ano antes. Até essa data a Intendência apenas auxiliou nos casos especiais de epidemias, facilitando os meios de vacinação, feita de forma gratuita por médicos práticos e farmacêuticos. Entre 1902 e 1914, as verbas destinadas à saúde pública eram exíguas. Cidade menor, com reduzida pavimentação, de hábitos patriarcais, onde muitas enfermidades, de que se ouvia falar ainda não tinham estabelecido arraias. A caridade particular e a benemerência dos médicos e farmacêuticos locais supriam as necessidades. Assim, ao ser criado definitivamente o cargo de médico da municipalidade, com vencimentos estabelecidos, deu-se, implicitamente, o primeiro passo para a evolução do departamento. São do então Intendente Municipal, Coronel Pedro Lopes de Oliveira, estas palavras: “O obituário dessa cidade acusa um grande número de casos que têm como causa essa terrível enfermidade (tuberculose). Há pouco observava-se aqui espaçados casos dessa moléstia, a maior parte deles em pessoas forasteiras, que aqui vinham pelo clima admirável do município. Hoje, infelizmente, os casos de tuberculose se equilibram em número entre os forasteiros e os moradores, existindo irradiações do terrível mal por diversos pontos da cidade”. E foi assim que a Assistência Pública, mesmo de forma rudimentar, foi criada na cidade. A invasão da tuberculose alertou a defesa.

O Dr. Fernando de Carvalho ficou no cargo de médico da Assistência Pública até 1918. Em seu lugar assumiu o farmacêutico prático, Oscar Pinto de Morais. Nascido em Passo Fundo, em 1876, que, desde os primeiros anos do século XX, aparece como farmacêutico da Farmácia Fidelidade, de seu pai, e, posteriormente, da Farmácia dos Pobres. Mais tarde, em 1911, era proprietário da Farmácia Brasil, com seu irmão Miguel Pinto de Morais. Na edição do jornal O Gaúcho, de 31.8.1911, a família Marques publicou anúncio de agradecimento pela dedicação e zelo profissional que o médico Dr. Nicolau de Araújo Vergueiro e o farmacêutico Oscar Pinto de Morais tiveram, por ocasião da enfermidade de Ignacinha Marques.

Por que então um farmacêutico prático assumiria a Assistência Pública Municipal, se havia, para fazê-lo, médicos diplomados estabelecidos na cidade? Os verdadeiros motivos, que levaram o Intendente Coronel Pedro Lopes de Oliveira a entregar o posto a um prático, são desconhecidos. Presume-se que tenha sido por motivos políticos. Senão vejamos. Em 1917, com a morte do Coronel Gervásio Annes, houve um “racha” no Partido Republicano local e, conseqüentemente, uma disputa pelo poder. A corrente liderada pelo líder do partido, Dr. Vergueiro, secundado por Gabriel Bastos, contou com o apoio do Presidente do Estado, Borges de Medeiros, e da grande maioria dos republicanos do município. Enfraquecido politicamente, o Intendente Coronel Pedro Lopes de Oliveira, que tentava mais uma reeleição, foi fragorosamente derrotado nas urnas, em 1920. Considerando a importância dada à política naquela época, o número ainda reduzido de profissionais da área atuando na cidade e a condição de médico do candidato oposicionista, é possível que não houvesse um médico diplomado disposto a assumir o cargo público.

O ano de 1918 contou ainda com dois acontecimentos importantes na cidade, com relação à área médica. Em 24 de junho, por iniciativa do Padre Rafael Iop e da Sociedade São Vicente de Paulo, foi criado o Hospital São Vicente de Paulo, que passou a funcionar naquele mesmo ano, e que hoje se transformou num dos maiores hospitais do Rio Grande do Sul. Seu lema: “Justiça, Caridade, Renúncia”. Se a notícia da criação de mais um hospital era alvissareira, a outra foi uma verdadeira catástrofe: a chegada em Passo Fundo, por volta do mês de setembro, da gripe espanhola. Em apenas um ano, a pandemia espalhada pelo mundo dizimou mais de 30 milhões de pessoas. A doença, uma variação do vírus da gripe comum, causava um terrível agravamento de seus sintomas. Sabia-se que a doença era causada pelo frio. O termo influenza, sinônimo de gripe, vem do italiano, influenza di freddo (influência do frio). Sua origem ainda hoje é controvertida. Uma das primeiras vítimas foi o Rei da Espanha, Afonso XIII, por isso acreditou-se que ela tenha tido origem nesse país. Outros pesquisadores afirmam que teria começado nos Estados Unidos, sendo levada por soldados para a Europa, durante a Primeira Guerra Mundial. A doença se propagou em duas gigantescas ondas: a primeira, no verão de 1918. Nessa fase, muito contagiosa, não causou muitas mortes. Em agosto do mesmo ano, uma forma altamente virulenta da doença se disseminou pelo mundo. No Brasil, foram cerca de 35 mil mortes. Entre as vítimas, o presidente eleito, Rodrigues Alves, que morreu em janeiro de 1919, antes mesmo de assumir outro mandato. Em Passo Fundo, os historiadores afirmam que cerca de duas mil pessoas morreram, em razão de terem contraído a doença. Nos dois hospitais do município, várias pessoas que, voluntariamente, ajudavam os enfermos, adquiriram a doença e algumas faleceram.

Uma prática comum, desde os primeiros anos do século passado até meados da década de 30, era a chamada “excursão profissional”. Médicos especialistas, vindos principalmente de grandes centros, como Porto Alegre, São Paulo e até mesmo do Uruguai e Argentina, chegavam a Passo Fundo, hospedando-se em hotéis, onde davam consultas. O jornal O Gaúcho, edição nº 15, de 29.4.1917, anunciou: “Dr. Júlio de Souza Velho, Professor da cadeira de olhos, ouvidos, nariz e garganta, da Escola de Medicina de Porto Alegre, ex-assistente do Professor Victor de Britto e Chefe de Enfermaria das mesmas especialidades da Santa Casa, em excursão profissional por esta cidade, oferece seus serviços à população, tanto médicos como cirúrgicos. Informações com o Dr. Carvalho”. Ou ainda, na edição nº 11, de 13.3.1915, do mesmo jornal, que noticiava: “Professor Giordano. Médico Cirúrgico. Notável médico, Dr. Érico Giordano, professor de ‘traumatolia’ da Faculdade de Nápoles, e sócio-honorário da Sociedade Médica de Buenos Aires, pretende permanecer algum tempo nesta cidade, e oferece ao público seus serviços profissionais. Acha-se hospedado no Hotel Familiar, onde dá consultas, das 9 às 11 horas da manhã e das 4 às 7 horas da tarde”.

Ainda em 1918, a municipalidade criou o cargo de Médico Municipal, no Povoado de Carazinho, e nomeou para exercê-lo, independente de remuneração, o Dr. Eurico Araújo. No mesmo ano fixaram residência em Passo Fundo, os médicos: Dr.A L. Lorenzini, diplomado pela antiga Universidade de Camerino, Itália, em 1906; e Dr. Armando Torres de Vasconcellos, que montou uma farmácia homeopática e o respectivo laboratório. Durante a gripe espanhola, o Dr. Vasconcellos atendeu 18 pacientes infectados, em sua própria residência, pois não existiam mais leitos nos hospitais. Antes mesmo dos hospitais concluírem as obras de seus prédios, em 1920, aventou-se a possibilidade de ser realizada uma fusão entre eles. A tentativa foi rechaçada pela direção do Hospital de Caridade, que era uma instituição perpétua e, portanto, sua existência e norma não podiam ser alteradas, segundo os estatutos. Ademais, existia um confronto entre a Maçonaria, que mantinha a direção do Hospital de Caridade e a Igreja Católica, mantenedora do Hospital São Vicente de Paulo. Foi a primeira e única vez em que tal fato foi cogitado.

O ano de 1921 foi profícuo para a medicina de Passo Fundo, com a chegada na cidade de vários médicos de elevado conceito profissional, que, com o passar dos anos, deram relevante contribuição para o progresso e para a história da medicina. Entre eles, Dr. Dino Câneva, médico italiano, competente cirurgião, que serviu como médico-militar na 1ª Guerra Mundial; Dr. Frederico De Marco, formado pela Universidade de Bolonha, Itália, com serviços prestados em hospitais de Paris, Roma, Buenos Aires e São Paulo; Dr. Emilio Eifler, formado pela Faculdade de Medicina de Porto Alegre, que serviu como interno na Santa Casa de Misericórdia; Dr. Odilon Berendt de Oliveira, cirurgião e obstetra, formado pela Faculdade de Medicina de Porto Alegre; Dr. Irineu Vasconcellos, irmão do Dr. Armando Vasconcellos, com quem dividia clínica e farmácia; e Dr. Antonio Carlos Rebelo Horta, diplomado pela Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, com prática na maternidade de Laranjeiras e Instituto de Proteção à Infância, da Capital Federal. Atendia como clínico geral e pediatra. O Dr. Rebelo Horta foi uma pessoa atuante em vários segmentos da sociedade. No aspecto político, como líder do Partido Libertador, no aspecto social, como dirigente do Clube Comercial; e no esportivo, como presidente do Sport Club Gaúcho. Além disso, foi o primeiro Diretor Clínico do Hospital São Vicente de Paulo, em 1933, quando este cargo foi criado.

O jornal A Época, nº 59, de 16.3.1922, traz matéria sobre o Hospital São Vicente de Paulo, que enfoca: “... O notável empreendimento da construção do hospital, levado a efeito pelos esforços do incansável benfeitor Rev. Padre Rafael Iop, tem continuado com notável progresso sob a administração da Exma. Diretora Madre Innocência, auxiliada eficazmente por três irmãs de caridade. A seção dos pobres, comportando dez a doze doentes, está quase sempre completa, com real benefício à indigência. Os humanitários médicos, Drs. Antonio Rocco e Dino Câneva, continuam prestando seus serviços profissionais ao hospital e socorrendo gratuitamente a pobreza, com os recursos da ciência que cultivam”. Essa citação dá a exata dimensão da missão do médico, que fazia um verdadeiro sacerdócio de sua profissão.

No mesmo ano, Passo Fundo conheceu a primeira médica a clinicar na cidade. Tratava-se da Dra. Célia Pedroso, especialista em doenças de senhoras e Direção, médicos, e enfermeiras do hospital de caridade crianças. Chegou acompanhada do esposo, também médico, Dr. Achylles Pedroso. Mantiveram, por alguns anos, consultório junto à Farmácia Borges da Rosa.

Ainda em 1922, o jornal A Época, nº 62, de 6 de abril, parecia antever, em muitos anos, o que aconteceria em Passo Fundo, em relação a ser um pólo médico-hospitalar de excelência. A notícia precisava o seguinte: “Anexo ao Hospital de Caridade, que sofreu reformas para este fim, foi aberto um gabinete médico, chamado Policlínica, sob a direção dos Drs. Nicolau Vergueiro, Arthur Leite e Frederico De Marco, a qual dispõe de todo o material necessário – corpo de enfermeiros habilitados, aparelhamento completo de cirurgia, grande autoclave para esterilização do material cirúrgico, e um aparelho de raios-X para radioscopias, radiografias etc. Possui poderoso microscópio para exames no campo da microbiologia. Serão feitos também exames completos de urina e de sangue, pela reação de Wasserman, Widal etc. (...) Passo Fundo se tornará em breve o centro médico de todas as localidades menores dessa região”.

Se os médicos e hospitais tratavam de buscar novas tecnologias e avançavam para as curas das doenças, a saúde pública continuava sofrendo com o descaso. O Relatório Municipal de 1924 acusa que 33% dos óbitos foram registrados como ‘sem assistência’ médica, ou seja, em cada 100 pessoas que faleceram, 33 não tiveram nenhuma assistência, sem atestar a causa mortis. E considerando que, entre essas 100 pessoas, as ricas ou as simplesmente remediadas, e mesmo aquelas que dispunham de algum recurso, por parcos que fossem, apelaram para a medicina particular, chegaremos à conclusão insofismável de que sobre esses 33% recaiam a pesada carga da miserabilidade inteiramente desprotegida.

A partir de 1926, a saúde pública teve uma sensível melhora. O Departamento de Assistência Pública foi entregue ao Dr. Arthur Leite, que realizou uma série de melhoramentos, entre eles a aquisição de um microscópio Lentz, de última geração. Notável também foi o combate à sífilis, causa de 25% dos casos atendidos pela Assistência Pública. Ao término da administração Armando Annes, o Dr. Arthur Leite afirmou em seu relatório: “O terreno está preparado. Fácil será os vindouros melhorar, modificar, ampliar e desempenhar com maior proficiência o cargo que ocupamos. Reconhecemos que ainda existem lacunas a preencher, mas, como já observamos, agimos sempre dentro do círculo de ferro, que uma verba limitada, para uma seção com tão pesados encargos, oferece”. Referindo-se ainda ao Intendente que deixava o cargo, salientou: “Um ligeiro confronto desse relatório, com o dos anos anteriores, demonstra, de maneira frisante, o aumento progressivo da freqüência, nesse serviço, cuja organização é relativamente recente. Procuramos seguir à risca a diretriz que delineastes, movido pelo sentimento de filantropia, e impressionado com o número elevado de infelizes que pereciam ao abandono, sem assistência médica – fatos que só poderão agora se reproduzir por ignorância ou má vontade – já que resolvestes organizar a seção que me confiaste”. Passo Fundo estava entrando numa outra década (30) e com outra mentalidade em termos de saúde pública.

Armando Annes deixou a Intendência para o Dr. Nicolau Vergueiro, que manteve como médico da Assistência Pública o Dr. Arthur Oliveira Leite. Porém, em 1930, Vergueiro deixava o cargo para assumir, no Rio de Janeiro, a cadeira de Deputado Federal. Assumiu então Henrique Scarpelini Ghezzi, que a principio conservou no cargo o Dr. Arthur Leite, o qual, meses depois, solicitou seu afastamento. Assumiu o Dr. Armando Torres de Vasconcellos, tomando medidas práticas e eficazes, em relação à saúde pública e à higiene. Com relação à saúde pública: 1º - Transferir o consultório do prédio da Intendência para junto do Hospital de Caridade; 2º - Atender as pessoas por ordem de chegada; 3º Realizar visita diária de inspeção nas enfermarias dos hospitais, para atendimento aos indigentes; 4º - As fórmulas e preparados seriam aviados e fornecidos pela farmácia do hospital, com o carimbo da assistência pública; 5º - Anexo ao consultório funcionaria um posto permanente de vacinação contra a varíola; 6º - O atendimento domiciliar seria feito ao indigente pelo médico da Assistência Pública, somente em casos de urgência; 7º - O serviço de Obstetrícia ao indigente seria atendido exclusivamente no hospital, com a municipalidade pagando o transporte da enferma; 8º - Cirurgia feita pela assistência social, somente quando de emergência, por acidente ou desastre, cabendo ao médico da Assistência apelar para a magnanimidade de algum cirurgião da cidade, quando necessário fosse.

Com relação à higiene municipal, algumas medidas, hoje curiosas, eram necessárias para a prevenção das moléstias. Entre elas: 1º - Limpeza das ruas. Contratação de pelo menos dois funcionários para varredura diária das ruas calçadas, serviços divididos por zonas e inspecionados pelo fiscal de higiene; 2º - Águas e esgotos. Extinção das fossas sépticas e substituição por esgotos canalizados, para melhorar a qualidade da água dos poços. Como providência inicial, criação de um departamento para recolhimento e remoção do material fecal; 3º - Matança de ratos. Funcionários do serviço de higiene pública deverão, nos dias de chuva, ir a todas as casas levar alimentos com veneno para ratos; 4º - Matança de cães vadios. 5º - Sugerir à população que use recipientes com tampa para o depósito de lixo; 6º - Desinfecção de prédios ocupados por pessoas com doenças contagiosas, no caso de cura ou morte do paciente: 7º - Mercadinhos, casas de frutas e botequins, rigorosamente fiscalizados pelo serviço de higiene; 8º - Em hotéis, pensões, pensionatos, rigorosa fiscalização na cozinha, pátio e latrina; 9º - Barbearias devem possuir mesa com tampo de mármore e pia com reservatório de água: 10º - Fiscalização da qualidade do leite e limpeza dos vasilhames. As medidas foram executadas à risca, e todas as semanas o jornal O Nacional publicava os atos do relatório da Higiene Pública. Várias quitandas, bares e armazéns, tambos de leite e barbearias, foram fechados, temporariamente, até se adequarem às normas.

Outra inovação que chegava a Passo Fundo, no final dos anos 20, mais precisamente em 1928, foi a instalação do primeiro Laboratório de Análises Clínicas Tristão Ferreira. Estava alojado junto à Farmácia Central e tinha como responsável o Farmacêutico Tristão Feijó Ferreira, formado em Farmácia pela Faculdade de Medicina de Porto Alegre, em 1924. Tristão Ferreira foi professor das disciplinas de Química e História Natural do então Instituto Ginasial, hoje IE.

No dia 13 de junho de 1931, no andar superior da Farmácia Central, os médicos, Dr. Nicolau de Araújo Vergueiro, Henrique Benedito Frydberg, Tenack Wilson de Souza, Miguel Kozma, Arthur Oliveira Leite, Armando Torres de Vasconcellos, Dino Câneva, Antonio Carlos Rebello Horta, Clodoaldo Brenner, Odilon Berendt de Oliveira e Bruno Pelegrini, se reuniram para tratar de dois assuntos de especial relevância. O primeiro era a construção de um sanatório na cidade, e o segundo, a criação da Sociedade Passo-Fundense de Medicina.

Alarmados com o grande número de pessoas tuberculosas, os médicos Tenack Wilson de Souza e Miguel Kozma levaram, àquela reunião, o projeto para instalação de um sanatório em Passo Fundo, inexistente no Rio Grande do Sul. O isolamento dos tuberculosos era necessário em razão do alto contágio da doença. Os hospitais locais não possuíam as melhores condições para o atendimento da terrível enfermidade. Foram realizados estudos climatológicos e estes foram favoráveis. A Prefeitura Municipal cederia a área para construção do sanatório, na saída para Soledade. Os Drs. Tenack e Kozma seguiram a Porto Alegre, para tratar do assunto com a Diretoria de Higiene do Estado, e o projeto físico foi entregue à firma Dahne & Conceição, da Capital. Quando todos os olhos estavam voltados para a concretização do sanatório, uma voz se levantou em contrariedade. O jornalista José de Sá Britto, assinando com o pseudônimo U. V. Xis, publicou vários “a pedido” no jornal O Nacional. Dizia que Passo Fundo se tornaria uma “cidade fantasma” ou “cidade dos mortos”, e que todos os tuberculosos do Rio Grande do Sul viriam a Passo Fundo para morrer e contagiar a população. O entusiasmo inicial arrefeceu. Até uma pesquisa foi sugerida, para que médicos especializados na doença opinassem sobre os perigos que a iniciativa pudesse trazer à cidade. Mas nem mesmo essa pesquisa foi realizada. A população amedrontada ficou contrária à idéia, e o sanatório não saiu do papel. Alguns anos depois, o mesmo projeto idealizou o Sanatório Belém, construído em Porto Alegre.

A Sociedade Passo-Fundense de Medicina foi oficialmente criada no dia 14 de julho de 1931. A presidência ficou com o Dr. Nicolau de Araújo Vergueiro, sendo secretário geral, o Dr. Henrique Benedito Frydberg, orador, o Dr. Antonio Carlos Rebello Horta e bibliotecário, o Dr. Clodoaldo Brenner. Entretanto, a primeira ata oficial ocorreu na reunião ordinária do dia 3 de junho de 1932.

Foi a Sociedade Passo-Fundense de Medicina que, em 1931, recebeu com hospitalidade e pompa, a Srta. Anita Garibaldi, neta da “Heroína de Dois Mundos”,também denominada Anita Garibaldi. A visitante, em que pese seus amplos recursos materiais, servia nas batalhas e guerras, como enfermeira voluntária.

Na década de 30, a maior reivindicação dos médicos passo-fundenses, junto aos órgãos governamentais, se chamava saneamento urbano. Era inacreditável que, entre as grandes e mais importantes cidades gaúchas, somente Passo Fundo não possuía sequer água encanada. A cidade era uma célula isolada no organismo progressista do Rio Grande do Sul. Em março de 1935, surgiram os primeiros casos da febre tifóide. Outras doenças surgiam e se multiplicavam, por uma simples razão. Os médicos a apontavam com unanimidade. O grande agente provocador dessas doenças residia na insalubridade da água. A Prefeitura Municipal havia ficado acéfala com a renúncia, em caráter irrevogável, do Prefeito Armando Annes. Assumiu em seu lugar, interinamente, o Sub-Prefeito, Coronel Maximiliano de Almeida.

Homem de caráter e dinamismo, ouviu a reivindicação médica e chamou ao seu gabinete o Sr. Antonino Xavier de Oliveira, homem probo e igualmente preocupado com as questões do município, para que, juntos, fossem a Cruz Alta receber informações sobre como funcionava o seu saneamento urbano. Incontinenti, Antonino informou ao Prefeito que já existia, desde 1917, um projeto que viabilizava o saneamento urbano, elaborado pelo Dr. Saturnino de Britto, chamado na época ‘Príncipe dos Engenheiros’, pela excelência de seus trabalhos. Verificando o projeto, Maximiliano de Almeida constatou que o então Intendente, Pedro Lopes de Oliveira, havia despachado o projeto, ‘em caráter de urgência’. Porém, ele acabou esquecido pelos seus sucessores. A cidade, evidentemente, entre 1917 e 1935, havia crescido e o projeto teve de ser readequado à nova realidade. Porém, o custo financeiro da obra assustava o novo Prefeito, Nelson Ehlers. E novamente surgiram as contrariedades. Ao longo de sua história, Passo Fundo conviveu com brigas políticas e interesses partidários e até mesmo pessoais. De um lado, o historiador e Membro da Academia Passo-Fundense de Letras, Heitor Pires da Silveira, lançava artigos nos jornais, favoráveis à obra de saneamento urbano, com sugestões de onde se levantariam os valores para tal. Até mesmo o Laboratório de Análises Clínicas Ros, de propriedade de Germano Roman Ros, aqui estabelecido, colocou seus serviços e seus equipamentos à disposição para a análise da água. Por outro lado, o poeta e confrade Gomercindo dos Reis era veementemente contrário, pois alegava que esses custos seriam repassados aos contribuintes, com o aumento do imposto predial. Invocava a atenção do Sr. Arthur Lângaro, Presidente da Associação Comercial. Silveira rebatia afirmando que Gomercindo era contrário, pois era proprietário do Escritório de Corretagem Birô Reis, e por isso tinha interesses pessoais no caso. Em meio ao fogo cruzado, a população. Após tantas rusgas, a instalação da Cia. Hidráulica Rio-Grandense se deu s na segunda metade da secada da década de 40, portanto, extremamente tardia. Localizava-se na Vila Cruzeiro, antigo campo do 14 de Julho, e atendia apenas a parte central da cidade, situação que perdura até os dias atuais.

O consultório da Assistência Pública, que desde 1931 funcionava no Hospital de Caridade, passou a atender no Hospital São Vicente de Paulo, em 31 de janeiro de 1935. Quando encerrou o primeiro contrato, a municipalidade efetuou uma concorrência pública, vencida pelo Hospital São Vicente.

O Capitão-Médico Dr. Enapino Brusque de Andrade, pertencente ao IIIº 8º Regimento de Infantaria, chegado a Passo Fundo em setembro de 1936, trouxe outra novidade. Promoveu uma campanha de higiene pessoal e coletiva, através de filmes educativos, cujas sessões se davam no Cinema Coliseu.

O jornal O Nacional, de 26.2.1938, trouxe uma matéria assinada pelo senhor Heitor Pinto da Silveira, que pedia a contratação de mais médicos pela municipalidade. Afirmava ele que, apenas um médico para atender a cidade e todo o município, era um desapreço para com a população. Um município com aproximadamente 75 mil habitantes não poderia contar com a boa vontade e o labor extenuante de apenas um médico. Listava os distritos de Passo Fundo, nessa época, e suas distâncias, tais como: Campo do Meio (45 km), Coxilha (28 km), Nonoai (148 km), Marau (35 km) Júlio Mailhos (hoje Sarandi – 85 km), Sede Teixeira (hoje Tapejara – 59 km), Colônia Ernestina (44 km), Água Santa (56 km), Sertão (46 km) e Águas de Rondinha (100 km). Finalizava sua prédica citando o livro “Filosofia de Vida”, de Will Durant, tradução de Monteiro Lobato: “Assim foi no passado, assim será no futuro. Talvez os mais pobres jamais desapareçam da vida, porque não passam dos inevitáveis resíduos que o processo de seleção vai largando pelo caminho”.

O artigo 1º do Decreto 19.398, de 11.11.1938, do Governo Federal, proibiu a comercialização de medicamentos fora das farmácias. Antes, os remédios eram vendidos livremente em lojas e armazéns.

No dia 22 de maio de 1939, foi instalado em Passo Fundo o Posto de Higiene, departamento da Secretaria Estadual de Higiene e Saúde. Oferecia serviços de profilaxia das doenças transmissíveis; higiene pré-natal; higiene infantil; combate às verminoses; fiscalização de higiene; serviço dentário e serviço de educadoras sanitárias, que visitavam as residências. O Posto de Higiene funcionava numa casa localizada na Rua Uruguai, defronte à Praça Tamandaré. Era chefiado pelo Dr. Armando Torres de Vasconcellos que, desde 1934, fora nomeado Delegado Regional de Higiene e Saúde. Posteriormente, o Posto de Higiene foi transferido para a Avenida Brasil, num prédio localizado defronte à antiga Prefeitura Municipal.

A primeira Escola Profissional de Enfermagem e Parteira Prática funcionou a partir do dia 1º de maio de 1940, nas dependências do Hospital de Caridade. As formandas, ao final do curso, recebiam diploma de enfermeira e parteira, reconhecido pelo Departamento Estadual de Saúde. Numa entrevista à imprensa de Porto Alegre, sobre a escola de Passo Fundo, o Dr. Bonifácio Paranhos da Costa, do Serviço de Higiene e Saúde do Estado, afirmou: “A Escola do Hospital de Caridade está destinada a ser uma escola padrão no Rio Grande do Sul”. Seu primeiro corpo docente foi formado pelos médicos: Tenack Wilson de Souza, Armando Torres de Vasconcellos, Arthur Oliveira Leite, Clodoaldo Brenner, José Carlos de Medeiros, Jovino Freitas, Miguel Gonzales Sebastiá, Telmo Ilha, Fernando Lins e pelo farmacêutico Tristão Feijó Ferreira. Tenack Wilson de Souza foi o primeiro Diretor da Escola, seguido por Dr. Fernando Lima, Dr. Jovino da Silva Freitas e Dr. Admar Petracco. A Escola funcionou durante 32 anos, até 1972, encerrando suas atividades por motivo de mudança no ensino, efetuada pelo Ministério da Educação e Cultura.

Não há como se referir à história da Medicina sem mencionar o trabalho paciencioso e hábil das parteiras. Por suas mãos nasceram milhares de passo-fundenses, que depois se tornaram homens ilustres e muitos deles médicos de alta competência. Duas delas são lembradas até hoje pelos mais antigos: Natália Bonella e Angélica de Castro Otto. Bonella nasceu em Trento, Itália, em 1887. Diplomou-se no Curso Superior de Obstetrícia em Innsbruck, Áustria. Participou voluntariamente como enfermeira na 1º Guerra Mundial. Foi Diretora das Maternidades de Trento e Val Sugana, na Itália. Chegou ao Brasil, por volta de 1925, onde se aperfeiçoou e revalidou seu diploma em Hospitais de São Paulo. Fixou residência em Passo Fundo, em 1929, a convite do Dr. Dino Câneva, que já a conhecia na Itália. Com ele montou uma Casa de Maternidade e, quando ela se tornou pequena, criou outra, junto com o Dr. Arthur Leite, anexa ao Hotel Itália, na Rua General Osório. Natália Bonella faleceu em Passo Fundo, no dia 15 de outubro de 1976.

Angélica de Castro Otto, natural da cidade de Rio Grande, se formou no curso de Enfermagem e Obstetrícia, na Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre. Chegou a Passo Fundo em 1937, e atendeu aproximadamente quatro mil parturientes. Faleceu, aos 81 anos de idade, no dia 15 de agosto de 1972, nesta cidade.

Em 1940, aqui chegou, para fixar residência, o médico Sabino Arias. Profissional altamente competente e preocupado com o social. Passou mais de 10 anos atendendo a Assistência Pública, e percebendo, como os demais que o antecederam, parcos vencimentos. Homem de visão empresarial, edificou obras e loteamentos. Participativo, ligou-se a vários segmentos médicos e outros, que contribuíram para o desenvolvimento e progresso da cidade. Deixou Passo Fundo para ir residir no Rio de Janeiro, em meados da década de 60, mas continuou colaborando, mesmo de longe, para que empreendimentos necessários para a cidade fossem concluídos, como, por exemplo, a Faculdade de Medicina da UPF.

Partiu dos médicos, Dr. Armando Torres de Vasconcellos e Dr. Álvaro José Martins, junto com um grupo de rotaryanos, especialmente senhoras da sociedade passo-fundense, a iniciativa de criar a Sociedade de Amparo à Maternidade e Infância (Sami), em 12 de abril de 1942. Essa entidade filantrópica atende mães e crianças carentes até o presente momento.

No ano seguinte, reorganizou-se a seção da Cruz Vermelha em Passo Fundo, tendo como Presidente a Sra. Djanira Lângaro.

O Dr. César José Santos inaugurou, em 1944, a clínica que levou seu nome. Realizava serviços de radiologia, radiografia, radioterapia e abreugrafia. Por quase 60 anos atendeu os passo-fundenses.

Em 1946, assentaram residência e consultório em Passo Fundo, os médicos Dr. Sawa Lachno, de origem russa e larga ficha profissional na Europa, e o Dr. Giovani Maffei, italiano, formado pela Universidade de Nápoles, em 1928, com trabalho no Hospital Humberto I, de São Paulo, e vindo da cidade de Guaporé. O Dr. Giovanni Maffei foi o responsável pelo consultório montado no Círculo Operário, para atendimento aos seus associados.

A Associação Médica do Rio Grande do Sul, seção de Passo Fundo, foi instalada em 1951, e teve como primeiro Presidente o Dr. César José dos Santos; Vice-presidente, Dr. Jesus Mário Flores Lopes; 1º Secretário, Dr. Bernardino Costa Santos; 2º Secretário, Dr. Demócrito Santana; 1º Tesoureiro, Dr. Alberto Lago e 2ª Tesoureira, Dra. Josephina Balestreros. Os demais fundadores da Amrigs de Passo Fundo foram os médicos: Abid Jevet, Alípio Kopper, Antonio Marinho Albuquerque, Clodoaldo Brenner, Guido Padilha, Henrique Frydberg, José Carlos de Medeiros, Jovino da Silva Freitas, Luis Phelippe Pereira da Cunha, Miguel Tabbal, Nicolau de Araújo Vergueiro, Odaglas Salgado, João Oreste Medaglia, Paulo Prates Aveline, Sabino Arias, Sawa Lachno, Telmo Ilha, Tobias Wainstein e Wolmir Foresti.

No dia 1º de janeiro de 1954, foi instalado em Passo Fundo o Serviço de Assistência Médica e Domiciliar de Urgência (Samdu). Foi um serviço de atendimento médico criado em fevereiro de 1950, pelo Presidente Eurico Gaspar Dutra, e tinha como limites pré-fixados de atendimento, os contribuintes e beneficiários dos institutos e caixas de aposentadoria e pensão. No governo Getúlio Vargas, graças à interferência do Ministro do Trabalho Indústria e Comércio, João Goulart, o atendimento, uma vez conveniado pelas prefeituras, se estendeu a todos, indistintamente. Em Passo Fundo, o convênio foi firmado na gestão do Prefeito Daniel Dipp, e assim o Samdu encampou o Serviço de Assistência Pública Municipal. Inicialmente, o Dr. Sabino Arias, que era médico da Assistência Pública, foi convidado para chefiar o Samdu. O convite foi recusado, pois o Dr. Sabino Arias estava de viagem de estudos marcada para os Estados Unidos e Europa. Assumiu a chefia do Samdu o Dr. Paulo Frydberg Frydberg Fragomeni, que clinicava na localidade de Ciríaco. O serviço funcionava em duas salas do prédio do Círculo Operário, cedidas pelo Ministério do Trabalho. Contava com uma ambulância e dois jipes, para locomover os médicos aos atendimentos domiciliares. O Samdu começou a funcionar oficialmente no dia 18 de janeiro de 1954, após solenidade de instalação que contou com a presença do Dr. Tasso Vieira de Faria, Diretor Geral do Samdu no Rio Grande do Sul. Além do atendimento médico, o Samdu distribuía remédios gratuitamente. Na primeira semana de funcionamento, o serviço atendeu mais de 100 pessoas por dia, e contava com os préstimos profissionais dos médicos, Paulo Fragomeni, João Oreste Medaglia, Hélio dos Santos Ferreira, José Carlos de Medeiros, Bernardino da Costa Santos, Abid Jevet, Matilde Wally Koernick Ferreira e Telmo Ilha.

Em agosto do mesmo ano, o Presidente Getúlio Vargas se suicidou, sendo substituído pelo Presidente Café Filho. Em janeiro de 1955, o Governo Federal, alegando necessidade de contenção de despesas, resolveu extinguir os serviços em várias localidades brasileiras, entre elas, Passo Fundo. A Assistência Pública voltou a ser competência da municipalidade. Porém, graças aos esforços da classe médica e de políticos locais, no mesmo ano o serviço foi restabelecido. O Samdu funcionou até 1968, quando, num ato governamental, todos os institutos e caixas de pensões e aposentadorias foram fundidos num só, o Instituto Nacional de Previdência Social, e a assistência pública ficou sob a responsabilidade do Governo Federal.

Luis Philippe Pereira da Cunha Ainda em 1954, foi instalado o Instituto Médico Legal de Passo Fundo. Antes, quando se exigia, o médico legista vinha de Porto Alegre, o que ocasionava sérios transtornos para os familiares do “de cujus”, pois não eram raros os casos de espera de dois ou três dias para a chegada do profissional, através de estradas de chão batido, que, em dias de chuva, eram intransitáveis. O primeiro médico-legista foi o Dr. Odaglas Salgado.

Em 1958, o Posto de Higiene já se chamava Centro de Saúde. Após vários anos em construção, finalmente, no dia 30 de agosto daquele ano, o novo prédio do Centro de Saúde, situado na Rua Paissandu esquina com Fagundes dos Reis, onde está instalado até hoje, foi inaugurado. A área para construção foi doada pela municipalidade, na administração do Prefeito Armando Annes. Atendido pelo Dr. Jesus Mário Flores Lopes, o Centro de Saúde dispunha dos serviços de dispensário de higiene pré-natal; higiene infantil; higiene pré-escolar e escolar; serviços de tuberculose; serviço de doenças venéreas; serviço de profilaxia da lepra; serviço de doenças transmissíveis; serviço de biometria médica e gabinete dentário.

Também em 1958, o Dr. Tobias Wainstein inaugurou a Samgi (Serviço de Assistência Médica Gratuita aos Indigentes). Funcionava na Rua Moron, numa sala cedida pela Ação Católica. O fornecimento de remédios, de forma gratuita, era uma doação de empresas locais e farmácias.

No ano seguinte, ao apagar das luzes de sua administração, o Prefeito Wolmar Antonio Salton inaugurou oficialmente o Hospital Municipal. Era o dia 30 de dezembro de 1959. Já no segundo dia de funcionamento, o médico Alberto Lago realizou uma operação de vesícula em um paciente. Ele foi em seguida designado como o Diretor do hospital, ocupando o cargo por muitos anos.

A Sociedade Pró-Universidade de Passo Fundo, criada em 1950, requereu ao Ministro da Educação, no dia 10 de julho de 1961, autorização para o funcionamento da Faculdade de Medicina. Era o primeiro e embrionário documento formulado para a concretização dessa faculdade. A década de 60 foi altamente proficiente para a Medicina em Passo Fundo. Vários médicos aqui chegaram e novas clínicas foram instaladas. Era uma espécie de preparação para a criação da Faculdade de Medicina que, ao longo do decênio, foi legitimando sua formação. Já em 1964, foi criado o Banco de Sangue Oswaldo Cruz, pelo médico Dr. Paulo Loureiro de Azambuja. O primeiro banco de sangue da cidade atendia aos três hospitais e tinha como bioquímico, o Professor Daniel Viuniski. Em 1968, foi inaugurado outro banco de sangue, chamado pela razão social de Duro & Miranda, cujos proprietários eram os médicos, Dr. Firmino Duro e Dr. Álvaro Miranda, donos também da Clínica Santa Helena. Nessa época, a doação de sangue era remunerada em todo o Brasil, e não se dispunha de um controle e cadastro dos doadores. Fazia-se transfusão de ‘sangue total’, isto é, quase na totalidade. Raros eram os pedidos de concentrados de hemácias. O plasma era utilizado, geralmente, para queimados. Os bancos de sangue recebiam pedidos dos hospitais de “sangue total fresco de família”. Na década de 70, os dois bancos de sangue de Passo Fundo se uniram e formaram, inicialmente, o Banco de Sangue Unidos, que logo depois passou a se chamar com o nome primitivo de Banco de Sangue Oswaldo Cruz.

A Policlínica de Passo Fundo foi outro marco na história da medicina local, no final dos anos 60. Médicos de diferentes especializações se reuniram num mesmo prédio, para facilitar o atendimento. Eram eles: Dr. Carlos Antonio Madalosso, especialista em gastroenterologia; Dr. Rudah Jorge, pediatria; Dr. Ruy Carlos Donadussi, urologia; Dr. Paulo Lamaison dos Santos, otorrinologia e Dr. Paulo Sérgio Crussius, neurologia. Com o passar dos anos, já na década de 70, agregaram-se o Dr. Julio César Teixeira, cardiologia; Dr. Roberto Azambuja, endocrinologia; Dr. Alberto Vilarroel Torrico, reumatologia; Dra. Marilene Ughini, dermatologia; Dr. Plácido Scussel, gastroenterologia, e Dr. Juarez Tarasconi, ginecologia. Em 1980, a equipe da Policlínica Passo Fundo, composta de vários outros profissionais, inaugurou seu novo prédio, na rua XV de Novembro, esquina com Rua Uruguai, chamado popularmente de “Redondão”, pelo seu formato, cuja arquitetura se baseou no Tower Bilding, de Nova York. Foi o primeiro prédio do sul do Brasil só com consultórios médicos.

Também no final dos anos 60, foi criada pelos médicos, Dr. Afonso Heckler, Dr. Jair Jesus Nicolini e Dr. Luthero Dutra Martins, a Policlínica Especializada, em otorrinolaringologia e oftalmologia.

No dia 30 de abril de 1969, foi oficializado definitivamente o funcionamento da Faculdade de Medicina, na Universidade de Passo Fundo. Até a aula inaugural, no dia 9 de março de 1970, proferida pelo Dr. Sabino Arias, foram pouco mais de 10 meses de intensos trabalhos, para os médicos fundadores, que formavam o corpo docente da instituição. Trabalhos que iam desde o estudo dos programas, e da reformulação do planejamento de ensino, até a preparação das salas de aula teóricas e dos laboratórios. Foi após a criação da Faculdade de Medicina que Passo Fundo começou a se tornar um gigante da área médico-hospitalar. A primeira turma a se formar, em 1975, tinha nada menos do que 46 alunos. Desta forma, a cada ano, uma leva de novos profissionais da área médica, muitos deles permanecendo em Passo Fundo, deu uma dimensão estratosférica ao número de clínicas e consultórios especializados, em relação às existentes antes da criação da faculdade. Ainda em março de 1970, os médicos, Dr. Gaston Endres, Dr. Carlos Roberto Vargas Leal e Dr. Daltro Gonçalves Dias, inauguraram o Pronto-Socorro de Fraturas. Era algo inédito na cidade. Antes disso, os serviços de traumatologia e ortopedia somente eram atendidos nos hospitais. Plantão 24 horas, serviço de urgência, raios-X, gesso e imobilização com talas, numa só clínica, era o que o Pronto-Socorro oferecia.

Seis anos após, em 1976, o número de traumatologistas e ortopedistas na cidade tinha aumentado. E uma só clínica especializada não comportava a demanda. Os médicos Dr. Paulo Bertol e Dr. José Luiz Gouveia Sobrinho decidiram então inaugurar o Instituto de Ortopedia e Traumatologia – IOT. Seu lema era: “Atendimento Ortopédico Especializado, Boa Relação Médico-Paciente, baaseados em Produção Científica Própria”.

A Clínica Infantil, dos médicos Dr. Cláudio Roberto Coracini, Dr. Francisco Cassol de Bittencourt e Dr. Wilson Vieira Marques, criada em 1973, foi um marco no atendimento em pediatria. Igualmente o Instituto de Patologia, dos médicos patologistas Dr. Aventino Alfredo Agostini e Dr. Luiz Carlos Trindade, inauguraram um serviço altamente especializado, para atendimento aos hospitais e às clínicas.

O desenvolvimento na área da Medicina em Passo Fundo deve-se também ao convênio firmado na década de 70, pela Universidade de Passo Fundo e o Hospital São Vicente de Paulo, que passou a atender como hospital-escola. Desta forma, não havia outro caminho a seguir senão o incremento da tecnologia e da qualificação profissional.

Passo Fundo entrou na Era dos Transplantes, ainda em 1969, quando foi realizado o primeiro transplante de córnea, no Hospital São Vicente de Paulo, feito pelo Dr. Luthero Dutra Martins. Em 1981, realizou-se o primeiro transplante de rim, no interior do Rio Grande do Sul, através do médico Dr. Ruy Carlos Donadussi. Em 1990, a equipe médica formada, entre outros, pelos Drs. Paulo Ceratti Azambuja, Roque Faleiro e Luis Sérgio Fragomeni, realizou, no Hospital São Vicente de Paulo, o primeiro transplante de coração, no interior e no sul do Brasil. No ano 2000, ocorreu o primeiro transplante de fígado, pelo médico Dr. Paulo Reichert, no mesmo Hospital. Foi um sucesso, e hoje, após mais de setenta cirurgias, é referência no Rio Grande do Sul.

Hoje o município é consagrado mundialmente como um Centro de Excelência em Medicina. Isso graças a todos os médicos que aqui labutaram; que ajudaram a abrir hospitais, clínicas, instituições de classe; que, desde as priscas eras, com sua contribuição individual, doando um microscópio ao hospital, ou atendendo gratuitamente os menos favorecidos, contribuíram para que essa gigantesca onda de conhecimento e competência inundasse nossa cidade, alavancando-a para a progresso. Foram profissionais que não pouparam esforços e recursos próprios para se especializarem-se, alcançando o mais alto conhecimento e avanço tecnológico da Medicina. Isso tudo para o atendimento mais completo e humano de seus pacientes. Coroando todo esse trabalho, no dia 15 de outubro de 2002, foi criada, por um grupo de médicos, a Academia Passo-Fundense de Medicina, instalada oficialmente no dia 30 de maio de 2003.

Referências

  1. da revista Água da Fonte n° 06