O VELHO FÓRUM, PARTE DA MINHA VIDA

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O VELHO FÓRUM, PARTE DA MINHA VIDA

Em 19/10/2014, por Luiz Juarez Nogueira de Azevedo


O VELHO FÓRUM, PARTE DA MINHA VIDA

Luiz Juarez Nogueira de Azevedo[1]


Recordo o velho Fórum da Avenida  General Neto, que ocupava um dos terrenos onde se ergue hoje o nosso monumental  palácio da Justiça.   Foi ali que  me iniciei como advogado e,  por mais de 10 anos,  exerci meu ofício,  até  o prédio ser  demolido, em 1976, por iniciativa do juiz Flesch Chaves, então diretor do Fórum.

O casarão abrigou os serviços judiciários da comarca durante 44 anos,  de 1932 a 1976.  Passou a ser ocupado pelo Fórum  após a falência do antigo Banco Pelotense, que ali tinha a sua sede.  Nele chegou  a funcionar o cartório  do registro especial, de que o meu  pai era titular.  Contava ele que teve de mudar-se do local porque, estando o cartório  instalado numa sala do  piso superior, e   por ter  adquirido um pesado cofre para guardar os valores e os títulos sujeitos a protesto,   o juiz da época começou a preocupar-se  com o peso do cofre, temendo que  pudesse causar o desabamento do prédio, já então velho e precário.

Ali, em  fins de 1964, estreei no Tribunal do Júri, absolvendo meu constituinte. Advogado em início de carreira, tendo instalado meu escritório no prédio contíguo, juntamente com Warley Farinati  e Dárcio Vieira Marques,  frequentava diariamente o Fórum, para atender os meus processos. Como outros causídicos, despachava pessoalmente com os dois juízes, Euripedes Fachini e Milton dos Santos Martins —   com os quais aprendi muito do que sei. Era  nomeado frequentemente para defender réus sem advogado ou sem condições de pagar os serviços de um,  inclusive perante o Tribunal do Júri.  Assistia a atuação no júri dos grandes tribunos da época, além do velho Fiori os jovens Busato e Martinelli  e o promotor Ítalo Goron. Quando, como advogado de ofício (hoje defensor público), fui promovido para esta comarca, foi no velho Fórum  que, juntamente com meu colega Juarez Diehl,  instalei os serviços de assistência judiciária prestados pela Consultoria Geral do Estado.

Ainda nem entrado na adolescência, já  andava eu pelo   casarão da Gen. Neto.  Filho mais velho,  era encarregado  por meu pai de levar os livros para os vistos dos  juizes  e apresentar-lhes  documentos para despacho.  Às vezes até os procurava no Café Elite, onde iam nos intervalos para uma prosa e rodada de cafezinhos.  Assim, conheci  os inesquecíveis Drs. Germani, Melzer e César Dias, depois desembargadores no Tribunal de Justiça.   Quando o  pai foi designado distribuidor substituto era eu, menino ainda,  quem buscava e trazia os processos para distribuir,  lançar os cálculos e fazer partilhas.    Nesse  período conheci praticamente todos os advogados e também os  velhos escrivães: Jônatas Magalhães Ferreira e Hildebrando Ribeiro, do 1º e 2º cartórios do cível e crime, José Luiz de Carvalho Nobre e João Azevedo Lopes, os  de órfãos e ausentes, além de Ricardo Rico, do cartório da provedoria e casamentos,  e  Homero Goulart Magalhães, do júri e execuções criminais. E também os quatro oficiais de justiça: Prócoro Coelho Velásquez, Henrique de Almeida Cruz, Leão Nunes de Castro e Lion Machado.

O prédio,  era de dois pisos, o superior com duas sacadas e uma janela ao centro, deitando para a Avenida. No térreo  era  o salão  do  júri,   de tetos altos, iluminado por seis grandes lampadários de latão.  Aberto unicamente  em  dias de julgamento ou em oportunidades especiais, era mobiliado  com  estantes escuras e grandes cadeiras forradas de couro. Artísticos cancelos dividiam o  auditório da parte reservada ao público.  Acima do estrado  do juiz, onde se via a urna para o sorteio dos jurados, destacava-se  um grande e belo crucifixo. Dispostos simetricamente, ocupando também a parede lateral, os retratos de antigos juízes da comarca  pareciam vigiar do alto a boa  aplicação da Justiça. Dominava o ambiente, de um lado da sala, o impressionante relógio de carrilhão que hoje ornamenta o gabinete  do reitor da Universidade.    

Na grande entrada lateral, permaneciam  os oficiais de justiça comandados pelo  porteiro dos auditórios, cuidando da ordem, aguardando os  mandados e  atendendo as partes e advogados que os procuravam. Sentado à uma mesa rústica de madeira o  escrivão Maíno de Carvalho Nobre, em vez de ficar no cartório, preferia ficar por ali, autuando pachorrentamente os   seus processos, cujas capas preenchia à mão,   com sua caligrafia primorosa.

Nos fundos, em um anexo de madeira, flanqueando o pátio interno, funcionava a distribuição, cujo escrivão já era  o José Mário Lima Cruz.   Defronte a   uma escada interna por onde se subia  ao andar superior, ao lado da sala do café,   funcionava   o cartório do júri e execuções criminais, pelo qual respondia  o prestimoso escrivão Pery Mathias Lopes. Também ali esteve o registro civil,  ao tempo em que   Sady Miguel Leal era o oficial titular.     

No andar superior, defronte à Avenida,  estavam os gabinetes dos juízes, onde se realizavam as   audiências.   Na parte traseira do edifício,  os dois cartórios   do cível e crime.  No primeiro, assumira recentemente Reinaldo Schlemmer, amigo sem par, que muito me ajudou com  seus profundos conhecimentos da prática do processo;   no segundo, o titular era  Maíno Nobre,  que costumava  fazer brincadeiras jocosas à minha custa, não  levando muito a sério o jovem bacharel.     

Esse foi o Fórum que eu conheci nos primórdios de minha advocacia. Naquela velha casa, simpática e acolhedora, com o apoio e a compreensão dos juízes e funcionários que lá serviam, foi que enfrentei as minhas primeiras batalhas forenses e comecei a tornar-me um verdadeiro advogado.

Referências

  1. Ex-advogado. Procurador do Estado aposentado. Oficial do Registro de Imóveis de Passo Fundo.