Marília Mattos: uma justa homenagem

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Marília Mattos: uma justa homenagem

Em 30/11/2013, por Agostinho Both


AGOSTINHO BOTH[1]


Tarefa difícil é homenagear alguém de suas virtudes e feitos, Marília. Para mostrar esta dificuldade, lembro de um conto de Borges no qual um geógrafo foi convidado a traçar o mapa de uma região. Pois bem, o geógrafo, pela relevância da região, sentiu-se na obrigação de estendê-lo na exata proporção do espaço a ser mapeado.

Faltou papel ao geógrafo e, se o fizesse, os ventos facilmente levariam os papéis que mapeariam os lugares desejados. Então o geógrafo se conformou em reduzir a uma pequena folha a representação da relevante região. Os rios caudalosos se conformaram a um pequeno traçado, os vales férteis, a uma ridícula indicação e, as montanhas, em montículos mal traçados.

Semelhante ao geógrafo se encontra quem queira homenageá-la num rápido discurso. Como descrever a virtude da coragem que te fez valente diante de dificuldades em tua Esclerose Múltipla que se transformou em virtude, como avaliar as forças, para juntamente com um pequeno grupo, resgatar a identidade de Passo Fundo nos escritos de Antonino Xavier. Tudo isso somente pode ser avaliado em rápidas abstrações.

Lembro, então, você recolhendo de Francisco Antonino Xavier e Oliveira os escritos impressos e os inéditos, para transformá-los em volumes expressivos para esclarecimento de nossa história. Lembrar dos esforços é muito pouco. Quem poderá medir as noites de estudos conjuntos, quem poderá medir a trabalheira que foi conquistar o tempo necessário para compilação da obra? A persistência e a decisão foram semelhantes às mesmas virtudes dos primeiros habitantes do planalto. Você, Marília se aproxima da própria obra de seu autor, pois sem seu trabalho generoso e esclarecido não haveria quem pudesse ter em mãos a história dada por Antonino.

A sua aproximação da obra de Francisco Antonino Xavier e Oliveira se dá por duas razões; a primeira por ser neta do nosso historiador e geógrafo regional e por tal aproximação ter acesso aos escritos. A sua aproximação da obra, por outro lado, não possui somente cunho familiar e afetivo, mas de cunho institucional. Lembro de a Universidade de Passo Fundo, a partir de 1985, estar desenvolvendo seus primeiros estudos sobre sua identidade comunitária. E neste mesmo ano, foi publicado o primeiro texto sobre a origem das universidades comunitárias e oito anos após em 1993, a vice-reitoria produziu o livro a Criação da Universidade de Passo Fundo.

Lembro também da reedição da obra de Antonino Xavier e Oliveira publicada sob o título “Annaes do Município de Passo Fundo”, em três volumes (vol. I – Aspectos Geográficos, Vol. II – Aspectos Históricos e vol. III – Aspectos Culturais), editada pela Gráfica Editora UPF, 1990. Pois bem, o interesse em tal publicação resultou do interesse de a UPF buscar elementos de sua identidade pelo resgate histórico de sua comunidade. Para tanto nada melhor que resgatar os principais registros históricos, geográficos e culturais. Este significativo esforço da Universidade de Passo Fundo, sob o aval de Padre Eli Benincá e do reitor padre Alcides Guareschi, se deve precipuamente aos seguintes colaboradores:

Coordenadora do Projeto: Marília Mattos

Responsáveis pela revisão geográfica – Profas. Jandira Maria Cecchet Spalding e Marília Mattos

Responsável pela revisão histórica – Prof. Ari Carlos de Moraes Fernandes

Responsável pela revisão ortográfica – Profa. Lúcia Terezinha Saccomori Palma

Foram dez anos de perseverança, de insistência e de zelo de pessoas e de uma instituição, bem como da administração municipal. Particularmente Marília esteve presente tanto na produção como na articulação para a execução e edição dos três volumes. Imaginem o que são dez anos de constante exercício de paciência e cuidado para que Passo Fundo e a Universidade tivessem uma referência magnífica de sua identidade. Além destas obras de Antonino foram publicadas graças ao esforço de Marília as seguintes obras inéditas:

“Conferências 1923” proferidas no Instituto Educacional de Passo Fundo na comemoração dos 70 anos da escola. “Dicionário Histórico e Geográfico de Carazinho”.

“Hospital da Cidade de Passo Fundo: 80 anos de história – 1914-1994”.

“Coronel Chicuta Um passo-fundense na Guerra do Paraguai”.

Todas estas obras publicadas pela Gráfica Editora UPF, 1997.

Muito mais escreveu Marília. Foram publicados os seguintes textos em co-autoria:

“Diretrizes Curriculares do Ensino de Iº Grau, 1ª a 4ª série Sec. De Educação do Mato Grosso do Sul – 1980”.

“Projeto Passo Fundo Ano 2000”.

“Passo Fundo em busca de suas raízes” – co-autoria com o prof. Ari Carlos de Moraes Fernandes.

“Jornadas Literárias: representação gráfica de sua abrangência” – Publicado na Revista de Filosofia e Ciências Humanas.

Vejam, pois, senhores e senhoras a grandeza da contribuição de Marília Mattos para com a identidade histórica da região. Nada melhor que celebrar neste momento com quem buscou esclarecer o que estava escondido e nos foi dado a luz.

Sua obra não se esgota em seus escritos em parceria. Sua inserção e iniciativas se deram também na área educacional; vejamos pois em quais escolas e espaços educacionais andou:

01 - G.E. Agostinho Pereira de Pato Branco;

02 - E. E. Mário de Andrade de Fco. Beltrão;

03 - 49ª Inspetoria Regional de Ensino de Fco. Beltrão, abrangendo o Sudoeste do Paraná, como Supervisora Regional de Ensino;

04 - G.E. Fagundes dos Reis de Passo Fundo;

05 - G.E. Salomão Ioschpe de Passo Fundo;

06 - Colégio Marista Nossa Senhora da Conceição;

07 - Colégio Bom Conselho;

08 - 7ª Coordenadoria de Ensino de Passo Fundo;

09 - Universidade de Passo Fundo;

10 - Campus Universitário do Erechim, URI;

11 - Universidade de Chapecó, SC.

Destaque se faz necessário a sua participação como professora no curso de geografia da UPF, instigando seus alunos à compreensão de nossa realidade geográfica.

Não menos importante foi sua colaboração na administração educacional. Coordenou vários projetos junto ao Centro Regional da Fac. de Educação da UPF, dentre eles o de implantação das Diretrizes Curriculares do Mato Grosso do Sul, URI, UNOESC e do Departamento de Geociências da UPF. Assessorou várias comissões emancipacionistas de distritos da Região e também assessorou vários municípios da Região em fase de definição de divisas e construção dos seus mapas municipais.

Por fim:

Aposentou-se no Estado do Rio Grande do Sul depois de 33 anos de serviços; e na UPF, por invalidez com 24 anos de Serviço.

Se a doença limitou-a como professora, não a limitou, porém, como agente de solidariedade.

Em 2000 foi-lhe diagnosticada a doença de Esclerose Múltipla e a vida aí tomou outro rumo. Como ignorava do que se tratava, Marília passou a ler sobre a doença e teve a iniciativa de reunir os portadores de EM. Usou os meios de comunicação escrita, falada e televisionada.

A surpresa foi grande como diz ela textualmente: éramos muitas pessoas e o que me impressionou foi que grande parte deles era pré-adolescentes, adolescentes e adultos jovens, a maioria do sexo feminino. Criamos um grupo de portadores de EM e familiares, isso faz seguramente 12 anos. Temos reuniões mensais.

Muito mais seria necessário dizer sobre Marília. Parafraseando Lincoln em seu discurso de Gettisburg em 1863, digo:

“Nós muito pouco atentaremos, e muito pouco recordaremos o que eu disse, mas não poderemos jamais esquecer o que Marília fez. Que todos nós aqui presentes admitamos que os esforços de Marília não foram em vão. Que esta região, com a graça de Deus, renasça na liberdade por que sabe boa parte de sua história e o quanto ainda poderemos construir, tendo, por exemplo, o que esta mulher fez por todos nós.”

Referências

  1. Agostinho Both, educador e professor, é membro da Academia Passo-Fundense de Letras.