Sentir os ventos da aldeia para ouvir o mundo

From ProjetoPF
Revision as of 22:08, 16 November 2022 by Projetopf (talk | contribs) (Inserir artigo)
(diff) ← Older revision | Latest revision (diff) | Newer revision → (diff)
Jump to navigation Jump to search

Sentir os ventos da aldeia para ouvir o mundo

Em 28/06/2014, por Anderson Alves Costa


Sentir os ventos da aldeia para ouvir o mundo

Por Anderson Alves.[1]


Sabe-se que Stenzel Filho foi um “homem de caráter humanitário”, sempre envolvido em iniciativas em prol da sociedade arroiense. Por conseguinte, é possível que tenha acompanhado as atividades que deram início ao Grupo Escolar de Conceição do Arroio – atualmente Escola Estadual de Ensino Fundamental General Osório – em 1924, mesmo de publicação de “A Vila da Serra”. A Escola General Osório, criada para atender às crianças da vila, que até o momento estudavam em residências particulares, é contemporâneos do autor. Muitas são as perguntas que surgem em torno desta feliz coincidência. Participou Stenzel Filho de algum bate-papo com alunos do Grupo Escolar de Conceição do Arroio? Teve ele sua obra trabalhada pelos professores? Se mão pela obra, como os jovens estudantes da época conheciam o espaço onde moravam? O passado da vila e as histórias contadas de geração em geração eram assuntos recorrentes na sala de aula?

Como satisfazer nossa curiosidade sobre as questões acima se não há registros escritos a respeito? Sim, faço parte de uma geração de pesquisadores curiosa. Ler manuscritos, analisar fotografias, manusear documentos e vislumbrar construções do final do século XIX e início do século XX passaram de hobby a trabalho. Destacam-se os historiadores Jerri Almeida e Rodrigo Trespach e os pesquisadores Anderson Alves e Fabiano Marques, autores dos artigos desta edição especial. Ainda que o objetivo deste grupo seja o de pesquisar e escrever sobre temas pouco explorados até o momento, todos reconhecem a contribuição inestimável que os historiadores Guido Muri, Marina Raymundo, Marco Pereira e Pascoalino Ribeiro deram a nossa cidade. As inúmeras pesquisas e as publicações por eles realizadas nas últimas três décadas são de extrema importância para nós, pois nos localizam no espaço-temporal, geralmente servindo de ponto de partida às pesquisas históricas.

Mas de pouco adianta resgatar nosso patrimônio material e imaterial, bem como torna-lo acessível aos educandos por meio de pesquisas e livros publicados, se as escolas continuarem a supervalorizar as histórias do mundo e desprestigiar os eventos históricos locais e regionais. Como você pode ver, não fizemos parte de uma “geração ilha”, sem vínculos com o passado. O solo, as ruas, as calçadas, as fachadas dos prédios, as árvores, tudo que hoje é palpável aos nossos pés e olhos, com certeza, fazia parte do cotidiano de nossos antepassados. Com o advento do mundo virtual, ser sujeito atento ao que é instantâneo é o que nos torna protagonistas de nosso tempo. E as crianças e adolescentes têm facilidade em dominar esta tecnologia. Então, por que não utilizar esta ferramenta para promover o resgate histórico? Segundo o historiador e escritor Rodrigo Trespach, “em um mundo globalizado, onde a perda de identidade e o individualismo são comuns, fazer um contraponto, trazer o estudante para dentro da comunidade, para que ele conheça a realidade local e o poder do coletivo do qual ele pode ser agente ativo é muito importante”.

Para introduzir “o resgate histórico” nos espaços escolares, os docentes precisam participar de formações específicas. O professor, principalmente o da área de ciências humanas, antes de entrar em sala de aula, deve estudar a micro história da cidade e região. Conforme o professor e geólogo Fabiano Marques, a atividade a ser trabalhadas “tem que ter sentido pedagógico, ou seja, o docente tem que dar sentido ao tema exposto para fazer conexão com conteúdos das ciências humanas, tem que estabelecer sentido naquele conteúdo proposto”. Mas para que isso ocorra é necessário promover ambientes aprazíveis e trazer à discussão algo consciente, que faça sentido. Há a possibilidade desta “geração virtual” em idade escolar se interessar pelo passado. Para Trespach, “se o professor souber estimular isso, sim. Também é preciso mudar a maneira com que o professor (de História ou de Literatura) encara a sala de aula. É possível trabalhar Stenzel Filho e Machado de Assis? É claro que sim, mas isso também passa pelo professor”.

O passado – recente ou distante – do município de Osório ainda é desconhecido à maioria de seus habitantes. Muitos momentos históricos e seus ilustres personagens – famosos por ter o nome em evidência, folclóricos ou ainda desconhecidos – precisam ser revisitados. Se considerarmos que Osório completa em 16 de dezembro deste ano 157 anos, o que temos de pesquisa histórica à disposição é pouco. E cabe a nós, historiadores e pesquisadores, jovens e já consagrados, dar continuidade às pesquisas sócio históricas e socioculturais e publicá-las em jornais, revistas e livros. Parte fundamental do Ensino Politécnico, a pesquisa deve ser valorizada e incentivada pelos professores nos espaços escolares, principalmente a sócio histórica, para assim promover o encontro entre tecnologia e patrimônio histórico. A obra “A Vila da Serra” e a Escola General Osório chegam a seus 90 anos. O que sabemos a respeito? Precisamos revisitar o nosso espaço-temporal para nele fazermos sentido, pois apenas ouvir sobre o mundo sem antes sentir os ventos da aldeia é sair de cada desmemoriado.

Referências

  1. Editor da Revista Doispontos