Geny Araújo Rebechi, exemplo de educadora

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Geny Araújo Rebechi, exemplo de educadora

Em 02/01/2003, por Paulo Domingos da Silva Monteiro


Geny Araujo Rebechi, exemplo de educadora[1]

PAULO MONTEIRO[2]

Era um inverno frio, em 1964. Eu tinha nove anos e cursava a 3ª série do ensino primário no Grupo Escolar Parque e Grêmio dos Viajantes, atual Escola Municipal de Ensino Fundamental Pe. Jose de Anchieta, na Vila Gerônimo Coelho. Ainda eram aplicados castigos corporais aos que não faziam os deveres de casa ou não se comportavam bem nas aulas. Os principais eram ficar de joelhos sobre grãos de milho ou feijão, permanecer durante vários minutos com os braços abertos na porta da frente da Escola ou ficar trancado a chave na sala de aula, durante o recreio, com a merenda tomada pela professora.

O tempo político também era frio, mas disso eu não tinha consciência. No dia 1 de abril havia sido implantada a ditadura militar no País. Num daqueles dias frios, deixei de fazer o dever de casa, por não saber fazê-lo. Como resultado, no dia seguinte, minha merenda foi confiscada e fiquei preso na sala de aula. Nos dias seguintes continuei, como protesto, sem fazer os temas e acumulando os castigos (temas adicionais) que recebia. Ao terceiro dia escapei pela janela e fiz meuprimeiro discurso de protesto, em pleno pátio da escola, xingando a professora e todos seus ascendentes e descendentes. Seu nome? Apaguei da minha memória.

Consegui transferência e fui estudar no Grupo Escolar Cardeal Leme, que se localizava na parte fronteira da atual sede social da UNIMED, próximo a Santo Antão.

Ali fui ter como professora Geny Araújo Rebechi, que, mesmo não largando uma grossa régua de madeira, impunha-se pela sua autoridade moral e não pela truculência. Era professora de várias turmas, merendeira, servente, enfermeira. Em suma: desempenhava todas as atividades necessárias ao bom funcionamento de uma Escola. Todos tinha recreio, menos a Dona Geny.

Essa mulher, de quem seus ex-alunos lembram com carinho, era a filha mais nova de uma família de onze irmãos: Florenal Leves Araújo, Anlenor Leves Araújo, Araci Leves Araújo, Abegail Leves Araújo, Leonardo Leves Araújo, Leonardo Leves Araújo, João Leves Araújo, Pedro Leves Araújo, Maria da Glória Leves Araújo, Ambrosina Leves Araújo e, finalmente, Geny, nascida no dia 18 de junho de 1925. Seus pais chamavam-se Sisnando Tibes Araújo e Leopoldina Leves Araújo. Foram seus avós paternos o capitão Lucas José Araújo e Maria Manoela Tibes.

Dona Geny cresceu na atual Vila Uniào que, mais tarde, mudaram-se para a localidade do Bom Recreio, onde se dedicaram à pequena agricultura e ao ramo de leitaria. A família, além de numerosa era pobre, vivendo com muitas dificuldades. Dona Geny, ainda na adolescência, perdeu a mãe, e logo a seguir seu pai faleceu. Araci, sua irmã mais velha, assumiu o comando da casa.

Geny Araújo Rebechi iniciou suas atividades como professora municipal subvencionada em la. De março de 1943, sendo designada para a Escola "Hipólito da Costa", em Jabotcabal, 1° Distrito, fazendo parte do Quadro de la. Entrância.

Durante muito tempo aquela jovem de 17 anos percorria 3,5 Km, de casa à Escola, cortando picadas e vencendo atoleiros, totalizando 7km, diariamente, a pé. Em 1946, casou-se com Alcides Rebechi, passando a residir na localidade de Jaboticabal, hoje Santo Antão. Ali nasceram seus três filhos: Vanderlei, Sirlei Salete e Roselei Bernardete, que lhe deram cinco netos: Tatiana Staudt, Tiago Staudt, Caroline Costa Rebechi, Cindy Rebechi Florâo e Cléber Rebechi Florâo. Em 1948 foi transferida para o Quadro de Professores Públicos Municipais – 2ª Entrância. Em 1954 foi designada para exercer as funções de diretora da Escola "Hipólito da Costa", que, em setembro, teve seu nome mudado para Grupo Escolar "Cardeal Leme", onde continuou exercendo, oficialmente, as funções de professora e diretora. Quando essa escola foi extinta localizava-se onde hoje é o Santuário Nossa Senhora Aparecida, na RST 53, Km 3, Bairro Jardim América. Aposentou-se no dia 3 de julho de 1970, conforme determinação do Decreto s/n, de 10 de agosto de 1970, falecendo na noite de 28 de março de 1993.

Durante três décadas, Geny Araújo Rebechi contribuiu para a alfabetização e a formação de crianças e adolescentes de toda uma vasta área do Município, onde hoje se situam as Vilas Gerônimo Coelho, Jaboticabal, Nossa Senhora Aparecida, Donária, Jardim América, e as localidades de Santo Antão, Bom Recreio e Santa Gema. Curiosamente, numa cidade onde há tantas ruas, avenidas e escolas com nomes de pessoas que nada fizeram para o engrandecimento de Passo Fundo e seu povo, o nome dessa educadora continua esquecido pelos nossos homens públicos.

Dona Geny continua viva na memória de centenas e centenas de passo-fundenses que ajudou a transformarem cidadãos e cidadãs porque fez de sua vida no magistério um ministério, em vez de uma simples profissão ou um bico. Um dia, porém, seu exemplo de educadora há de conquistar o merecido reconhecimento porque ninguém vive exemplarmente para acabar na vala comum do esquecimento.

  1. Publicado no Jornal O Nacional em 02/01/2003
  2. Pertence à Academia Literária Gaúcha e à Academia Passo-Fundense de. Letras.