Frutos de inverno
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Descrição da obra | |
Autor | Agostinho Both |
Título | Frutos de inverno |
Assunto | Romance |
Formato | E-book (formato PDF) |
Editora | Projeto Passo Fundo |
Data da publicação | 2013 |
Número de páginas | 128 |
ISBN | 978-85-64997-72-1 |
Formato | Papel 15 x 21 cm |
Data da publicação | 2014 |
Número de páginas | 124 |
ISBN | 978-85-8326-090-5 |
]] Frutos de inverno Procuro neste romance mostrar que o amor no advento da velhice pode provocar mudanças substanciais. As parcerias familiares podem contribuir para que isso ocorra. Um tempo maior para usufruir alternativas de objetivos pessoalmente determinados exige coragem e novas decisões. Em tudo se revela a vida densa de possibilidades quando são rompidas as tradições e os estereótipos.
Livro escrito por Agostinho Both, publicado em 2013
Apresentação
do Primeiro Capítulo, pelo Autor
Um amor de velho
Semelhante a um anjo de igreja, protetor de crentes e desvalidos, ele entrou em casa. Não fazia tanto tempo, todos dependiam dele. Eles possuíam essa sensação e ele de si mesmo. Ao entrar em casa já não havia o mesmo sentimento. A casa o protegia. Divulgava pra todos ser esse o único lugar de proteção. A mulher se fora, deixando-o viúvo de corpo e alma, suas filhas também o deixaram. Não sabia a razão de haver perdido a capacidade de atração. Não se revelava nele, fazia tempo, o poder de ser agradável e a necessidade de amigos. Percebia-se solitário. Sobrara sua neta Eliane. Quando as filhas chegavam era pra saber se estava tudo em ordem; dizia-se bem e elas partiam, mal haviam sentado. O silêncio não o importunava. Não havia mais o que dizer. As conversas com Eliane traduziam uma intimidade rara, suficiente. Nem ele sabia da pouca vazão do espírito, começando a ter soturnidade. Os vizinhos sabiam de seu simpático silêncio e dele se compadeciam: é um amor de velho. Quando perguntavam sobre sua quietude, ouviam um resmungo: já vi e fiz muito nessa vida. Carrego em paz tudo que tenho e do pouco que resta de mim, a minha neta dá conta sem cobrança.
O velho Idílio desejava a paz de sua casa, depois de qualquer interlocução. Apenas havia a garota entrando em seu espaço, sem incômodo. Curiosamente, a jovem entendia tudo de solidão. Precocemente aprendera a estar a sós. Não havia nela nenhuma tristeza em estar assim. A comunhão com a casa lhe bastava. Quando perguntavam sobre como se sentia por morar com um velho, podiam esperar: não meço o velho nem a casa pela idade, são meus companheiros. E que companhia! Não me vejam sem pai e sem mãe.
Quando lhe contestavam dizendo de sua juventude, respondia: cada um tem a medida que lhe convém. Isso levava a alguns de seus amigos inquirir mais sobre ela e o velho. Esclarecia:
Estou aqui de observadora dele. Vou além de baladas, tragos e rapazes; tiro o suficiente pra minha vida. Quando ele se for, viverei mais intensamente. Parecendo um colono, nele se esconde um professor de filosofia, pois em tempo saiu do seminário, permanecendo a inteligência dos clássicos. Comungo parecendo minha primeira comunhão. Não vou perder a oportunidade de viver dessa alegria. O amor me atravessa o tempo todo. Digo mais: mais que um velho, tenho-o pra mim como um mestre. Foi colono? Foi. Sua casa, porém, se enchia de livros e nunca deixou de ser próspero em palavras elegantes. Mesmo na austeridade das palavras com a mulher dele, minha avó, nunca chegou à vulgaridade. Disso prosperou um diálogo edificante.
–– Tenha dó, garota. Não se faz transfusão de virtude alguma.
–– Quem sabe de mim sou eu, garoto.
–– Mas pode estar cegada pelo momento.
–– Até pode ser. Depois, vou ver o que fazer. Por enquanto estou revendo conceitos e deixarei pra abrir olhos depois.
–– Que loucura, mulher!
–– A própria, de tão inusitada!
–– Mas, por favor, a reclusão retira tudo que a comunicação pode dar. E ele não tem mais o que dizer.
–– Desde quando o velho precisa de muito pra se comunicar?
––Será ele semelhante aos da beira da morte? Ao retornar saboreiam até um gole de água?
–– É bem isso.
–– Mas escuta, nem os parentes se aproximam dele com muito gosto.
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